Não importa o que aconteça, eu não vou perder a fé.

Só por hoje eu me rendo, como poucas vezes me rendi.
Caio de joelhos, e balbucio uma oração ininteligível para uma divindade qualquer.
Só por hoje, deixo de lado o peso, a dor de ter que aguentar tanta coisa em silêncio, e não suportar mais sorrir apesar de.

Apesar de, eu também tropeço e desabo. Apesar de, eu também sofro e choro.
Na maioria das vezes, escondido no banheiro, longe de um abraço que possa me levantar.
Só por hoje, abandono o personagem forte que montei ao longo dos anos, e resgato o verdadeiro rosto que me habita. Estendo a mão ao amigo que, assim como eu, desiste da armadura e se desmancha em lágrimas, porque já não pode esconder o que lhe dói. Está frágil demais para impedir que a emoção alcance os olhos.

Hoje, e não só por hoje, me permito ser mais flexível ao deixar o peito transbordar amor sem esperar que me amem da mesma forma. Hoje, mesmo sofrendo, me dou conta que ainda existe um riso frouxo atrás da cara amarrotada. O menino que mora em mim, estende as mãos e pede colo porque está assustado com os nãos do mundo.

Digo sim ao menino que sou, o acalmo no remédio de uma antiga canção, mesmo sabendo que ele não consegue mais dormir. Penso no quanto tenho deixado a desejar por não nutrir mais o imaginário da criança. Estou cansado demais para deixar que ela sonhe.

Mas não importa o que aconteça, eu não vou perder a fé. Não agora. Não neste exato instante, em que miro os olhos aflitos no espelho e vejo ali uma faísca de alegria, um punhado de esperança. A alma é uma imensa gaveta de sonhos multicoloridos, e eu não posso soterrar o menino que ainda sorri. Ainda há tantas paisagens para ver. Tanto mar. O sussurro no escuro me faz lembrar o quanto estou vivo, e por mais que diga que não, desejo a vida mais vibrante e bela.

Só por hoje, faço deste silêncio a minha prece mais genuína. Desta lágrima insistente, o grande salto para o recomeço. Bem provável, que ainda caia outras vezes e me renda, se assim tiver que ser. Mas não importa o que aconteça, eu não vou perder a fé.







ESTER CHAVES é uma escritora brasiliense. Graduada em Letras pela Universidade Católica de Brasília e Pós-graduada em Literatura Brasileira pela mesma instituição. Atuante na vida cultural da cidade, participa de vários eventos poético-musicais. Já teve textos publicados em jornais e revistas. Em junho de 2016, teve o conto “Os Voos de Josué” selecionado na 1ª edição do Prêmio VIP de Literatura, da A.R Publisher Editora.