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Esquecemos de cuidar de nós, na medida em que cuidamos em demasia dos outros, até que chegamos a um ponto de sonegação que já não somos capazes de oferecer nada a ninguém.
Vivemos em tempos de pleno egoísmo, em que pensar e se colocar no lugar do outro é algo extremamente raro. A tal da empatia é imprescindível para iluminar tempos escuros. Entretanto, como nada na vida é simples, é necessário que prestemos atenção no modo como nos doamos às outras pessoas, pois ainda que isso seja importante, por vezes, esquecemos que também precisamos nos amar.
Vejo muita gente falando sobre isso e, de fato, é algo que precisa ser dito. Todavia, não quero chegar no fim das contas ao lugar comum de um egoísmo mascarado de amor próprio ou a uma autoproteção exacerbada. Digo isso, porque se relacionar é quebrar a cara, não tem jeito. Uma hora ou outra, alguém vai te decepcionar, não vai corresponder às suas expectativas, nem ao afeto e ao cuidado que você proporciona.
E isso faz parte da vida em comunidade, composta por um emaranhado de relações sociais das quais fazemos parte. Para criar bons relacionamentos é preciso criar expectativas e investir do que você possui de melhor na pessoa, mesmo sabendo que sempre há o risco de se decepcionar e se machucar.
O ponto que quero levantar nesse texto é que mesmo estando aberto aos outros, é preciso que haja também um olhar e cuidado com si próprio, afinal, se você não estiver bem, como poderá oferecer algo de bom aos outros? No entanto, a verdade é que muitas vezes imergimos em relações e situações que retiram de tal modo o nosso ar, que paramos de respirar.
Esquecemos de cuidar de nós, na medida em que cuidamos em demasia dos outros, até que chegamos a um ponto de sonegação que já não somos capazes de oferecer nada a ninguém.
É claro que devemos ter carinho pelas pessoas, tratá-las bem, agir com humanidade, contudo, há certos momentos em que devemos parar, olhar-nos no espelho e ver se estamos de agrado com o que está sendo refletido. Ou seja, precisamos de um tempo só para nós, em que possamos refletir sobre como estamos, inclusive, nos nossos relacionamentos, a fim de que não nos suprimamos de tal modo que acabemos nos despedaçando por tamanha falta de cuidado com alguém que também devemos amar.
Outra coisa importante de ser dita é que nem sempre precisamos tirar de nós para dar a alguém. Isto é, em alguns momentos é necessário deixar que a pessoa ande com as próprias pernas, conte consigo mesma, experimente o mundo sem travas de proteção, quebre a cara; pois isso faz parte do processo de amadurecimento, tão importante para o crescimento de todos nós.
Mais uma vez, isso não significa que só devamos olhar para o nosso próprio umbigo, mas mesmo as pessoas que amamos e por isso estamos sempre querendo fazer de tudo para ajudar, proteger, cuidar; necessitam experimentar o mundo e certas vivências sozinhas, já que sem isso, estaremos nos esquecendo de nós para nos doar ininterruptamente a alguém, ao mesmo tempo em que deixaremos que o outro possa crescer e aprender que além de um receptor, também deve ser um vetor de afeto.
Buscar o equilíbrio na linha tênue entre o amor próprio e o egoísmo é realmente muito difícil, mas é essencial para que não nos tornemos pessoas fechadas em si mesmas, tampouco pessoas esvaziadas completamente do nosso eu. O que significa dizer em outras palavras, que toda relação é uma via de mão dupla, de maneira que precisamos ser retribuídos no afeto que doamos, bem como, de um tempo interior para que mantenhamos a nossa alma nutrida pelas nossas mãos, já que isso é vital para que estejamos completos nas nossas relações, sem que nos despedacemos para manter os outros inteiros.