“A poesia só é poesia por trazer deslumbramento ou perplexidade. Algumas vezes , traz os dois. Os textos do Joilson são assim: um susto que deslumbra.”
Nara Rúbia Ribeiro
NÃO VALE SONHAR
Aqui ninguém tem sonhos, moço.
Sonho pra nós, quando surge, passa breve,
é só assim uma pipa no céu, solta e leve, mais nada…
o resto tudo é desengano,
e se é que seja sonho, deve ser fraco, vontade sem sustança,
que dá e desdá como coisa rasteira.
Não é brincadeira, moço, aqui ninguém arrisca sonhar alto,
veja bem esses meninos, observe:
rabiscam com giz seus sonhos no asfalto, mas é coisa ligeira,
pois logo que um corpo tomba em combate
e o sangue lava o desenho, acaba com qualquer sonho de giz,
acaba o barato.
E vem a chuva que lava o sangue, faz-se de enchentes, traz o rato.
Aqui, moço, eu já disse,
só temos a realidade, o desespero.
Procure pra lá, bem pra lá nos bairros ricos,
talvez você encontre gente que sonha.
Aqui mesmo, só temos pesadelo.
Desacredita? então vá, vasculhe cada barraco, cace sonhos pelos becos
Espie nos buracos, nos quintais, repare na cara das mulheres,
nos olhos gulosos dos meninos sujos, mas…
Cuidado, pois aqui a morte ta bem viva nos olhos dos meninos,
sempre à espreita, doida para atacar num de repente.
e eles morrem sem sonhos, sem sorte
Mas as meninas, fazedoras de gente,
repõem de novo os meninos levados pela morte.
(Texto e fotografia de Joilson Kariri)
Nota da CONTI outra: o material acima foi reproduzido com autorização do autor.