Veio num domingo à tardinha, três de agosto. Chegou de uma vez, de malas, dançando com a beleza. Encheu meus silêncios de música, me contou seus começos e meios e fins. Cochilou no sofá, acordou ao meu lado, rezou comigo de manhã, antes da lida. Firme e mansa, me jogou amor na cara.
Fez a festa, pintou as paredes de riso. No ar, ventilou um hálito doce, fresco. Encontrou seu espaço, apertou os cintos e embarcou comigo na aventura do sonho. Partimos sem escalas rumo a um futuro imaginado, casório, casa, filhos, férias. Voamos alto, dividimos bagagens, a cama, o lanche, a conta do restaurante. Conhecemos nossos senões e porquês e poréns.
Miramos de perto um caminho longo, bonito, cercado de árvores e matos e flores e plantas na estrada que vai longe, imaginando como seríamos nós quando chegássemos às últimas sombras do jardim.
Trouxe comida, bebida, papel higiênico. Tentou arrumar a bagunça da casa e o tumulto de quem nela vive. Em vão. Há desordens nesse mundo que mão nenhuma organiza, conflitos eternos, internos, desarranjos permanentes.
Descobriu em mim um tumulto convicto, um olhar que se firma em nada e logo se perde de tudo, de todo. Despertou assustada no meio da noite com um barulho que estoura nas horas escondidas no vão do sofá. Teve medo do meu medo de morrer e espanto do meu jeito de me agarrar na vida. Mas que fazer? É assim. E assim as horas que ganhamos se foram.
Ficou três meses. Podiam ser três décadas, três anos, três dias, segundos. Daria no mesmo. Seu tempo ao meu lado foi o espaço exato, a eternidade de um instante. A nossa ilusão de amor eterno.
Fomos nossos. Breves almas gêmeas prematuras, nascidas e criadas no seio de um mundo de horas infinitas. Instantes que também acabam. Acabou.
A criatura de um domingo passado se foi para nunca. E eu lamento. Lamento para sempre não ter tido tempo de amá-la sequer.
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