O corpo em terapia: a abordagem corporal na psicoterapia junguiana

Muitas das pessoas que nos procuram para um tratamento psicoterápico trazem, além das questões emocionais e comportamentais, relatos de sintomas de ordem física, como: dores diversas (cefaléias, dores musculares, etc.), problemas gastrointestinais, cansaço, tensāo, desânimo, alterações do sono, do apetite, da memória, da concentração, da imagem corporal, entre muitos outros.

Também é notável que problemas como estresse, ansiedade, depressão e doenças em geral sempre apresentam sintomatologia física e psíquica associadas.

Assim, este artigo pretende, de maneira simples e acessível ao entendimento do público geral, trazer alguns esclarecimentos sobre o uso de psicoterapias que utilizam a abordagem corporal como recurso terapêutico.

Em uma abordagem integrativa não podemos conceber a psique e o corpo como entidades separadas e isoladas. É preciso perceber o ser humano em todas as suas facetas e compreendê-lo como uma unidade integrada.

Nossos sistemas psíquico, neurológico, endócrino e imunológico estão totalmente interligados. E por isso, corpo e psique estão em constante inter-relação. O que acontece em um aspecto repercute no outro concomitantemente.

Assim, quando ficamos ansiosos, percebemos imediatamente uma alteração dos nossos padrões corporais. Eleva-se o ritmo cardíaco e respiratório, apresentamos sudorese e vários outros sintomas relacionados. Quando conseguimos, por meio de exercícios de respiração e relaxamento, equalizar o ritmo respiratório e cardíaco conseguimos amenizar também os sintomas ansiosos. Esse é um exemplo simples dessa inter-relação corpo-psique.

Além disso, também podemos levar em conta que o corpo é um arquivo de memórias. Nele estão gravadas e “impressas” todas as nossas experiências de vida, conscientes ou inconscientes e todas elas carregadas de afeto. Por meio do corpo revivemos e reexperimentamos sensações, emoções e sentimentos de experiências confortáveis ou traumáticas. Nossas memórias formam o tom básico pelo qual percebemos a nós mesmos e o mundo.

Muitos pacientes que sofreram traumas e abusos, por exemplo, relatam sensações corporais relacionadas a esses eventos mesmo após haver decorrido muito tempo. O corpo manteve o registro do acontecimento que, muitas vezes, é insuportável para a consciência reviver.

Por conta de toda essa complexidade, uma psicoterapia capaz de atentar também para as questões corporais pode ser um diferencial no tratamento. Nesse modelo é possível considerar a totalidade do ser humano e corpo-psique como uma unidade indissociável.

Através de técnicas específicas (como os toques sutis, a calatonia, técnicas de relaxamento, percepção corporal, movimentos expressivos, entre outras) o corpo, uma vez tocado e mobilizado, pode produzir efeitos fisio-psíquicos, como sensação de relaxamento e conforto, além de experiências sensitivas diversas como: memórias, imagens, emoções e sentimentos que podem ser verbalizados e elaborados trazendo clareza e possibilitando maior integração.

De acordo com Sandor Petho,

“o relaxamento… pela comutação dos processos fisiológicos, de suas autoregulações, ritmos, ‘memórias’, reagibilidades e coordenações, retroage sobre a afetividade, alterando de modo intenso, também as reações da personalidade. O resultado será, além do ‘descanso’, o ‘desatar’ interno, a introspecção e a reprodução construtiva de antigas vivências, atingindo-se assim, novas coordenações e estruturação psicobiológicas” (1982, p.6).

Por permitir um rebaixamento do nível de consciência e facilitar o acesso as camadas mais profundas da psique, as técnicas de relaxamento como a calatonia e os toques sutis, permitem que o material inconsciente venha à tona, podendo ser expresso e conscientizado pelo indivíduo. O contato com o próprio corpo e com a psique de uma maneira mais abrangente e profunda permite o descondicionamento de padrões egóicos que o indivíduo está acostumado. Surgem então, novos caminhos e recondicionamentos que auxiliam a pessoa reequilibrar suas potencialidades.

Através de uma relação de confiança, ética e respeitosa é possível fornecer uma nova mensagem ao corpo ferido e traumatizado. É possível criar memórias de conforto que possam se sobrepor as anteriores e com isso, alcançar uma nova forma de perceber e ser no mundo.

Esse diálogo entre corpo e consciência pode auxiliar de maneira ímpar na dissolução de sintomas, reorganizando a psique. Assim, é possível trazer um novo equilíbrio para o indivíduo e promover saúde física e emocional.

Bibliografia:

CORTESE, F. N. Calatonia e integração fisiopsíquica, São Paulo: Escuta, 2008.

FARAH, R, M. Integração psicofísica: O trabalho corporal e a psicologia de C.G. Jung. São Paulo: Companhia Ilimitada, 2008.

RAMOS, D. G. A psique do corpo: A dimensão simbólica da doença. São Paulo: Summus, 2006.

SANDOR, P. Técnicas de relaxamento. São Paulo: Vetor, 1982.

SPACCALQUERCHE, M.E. (org) Corpo em Jung: Estudos em calatonia e práticas integrativas. São Paulo: Vetor, 2012, p. 19-38.

ZIMMERMANN, E. Corpo e individuação. Petrópolis: Vozes, 2009.

Autoria

Lilian Marin Zuchelli – Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Junguiana pela PUC-SP. Especialista em Psicoterapia de Abordagem Junguiana associada à Técnicas de Trabalho Corporal pelo Institiuto Sedes Sapientiae. CRP: 06/23768

 

 

Marcela Alice Bianco – Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Junguiana formada pela UFSCar. Especialista em Psicoterapia de Abordagem Junguiana associada à Técnicas de Trabalho Corporal pelo Sedes Sapientiae. CRP: 06/77338

Psique em Equilibrio

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