Parei pra analisar algumas ofensas recorrentes. Essa duas se repetiram muito ao longo dos meus quase 24 anos. Confesso, fiquei magoado e me travei algumas vezes. Culto, inteligente, até “poeta” na minha cabeça foram atributos negativos.
Não foram poucas as vezes que tentei ser mais raso. Me limitar a concordar ou reproduzir o que já estava pronto. Tantos dias, meses, em que fiquei sem expressar minha visão das coisas porque queria outro rótulo. Gente normal, quem sabe?
O de bonzinho, ou mole, ou covarde, ganhei por não querer odiar gratuitamente. Lá em casa, eu é quem apanhava do meu irmão mais novo. Nem doía. Era irritante. Mas bastava ele aceitar jogar bola comigo, ou preparar o feijão, eu já o perdoava.
Sentir ódio? Senti muitas vezes. Raiva de muitas pessoas por aí. O negócio é que raiva me faz mal. Nunca fiquei feliz por estar ofendido, magoado. E, talvez de maneira egoísta?, prefiro cuidar do que sinto. Reservo meu ódio às questões mais profundas; não encoste o dedo nas pessoas que amo. Odiar só porque X ou Y é de certa forma, tenho preguiça.
Óbvio. Eu tentei pagar de malzão diversas vezes pra me encaixar. Com certeza já peguei o bonde e falei mal de algumas pessoas de graça. Sem nada em troca. Depois, remoí o sentimento de culpa sozinho. Por fora, eu só não queria ser a mosca morta.
Aqui, eu poderia dizer que é tudo culpa das pessoas e dessa sociedade má. Talvez. Mas prefiro, diria, outra abordagem.
Normalmente, me chamaram de “metido a culto” quando na verdade queriam ou falar do meu ego ou me chamar de burro. É simples. Eu dou minha visão e a pessoa, por alguma razão, esquece do argumento e me ataca pessoalmente. É a forma de quem não vai com minha cara me calar. Eu já tive estratégia semelhante em alguns momentos da minha vida. É quase involuntário. A gente, quando mal percebe, está falando da pessoa e não do que ela argumenta.
Repare nos dois exemplos
– Cara, eu votei no candidato tal.
– Sério? Ele é um pilantra.
Neste primeiro exemplo o alvo é exclarecer quem é o candidato. Desta forma, é possível conscientizar do voto, discutir outras possibilidades.
– Cara, eu votei no candidato tal.
– Sério? Você é muito burro.
Neste segundo exemplo, desvia-se o assunto em questão ( votar no candidato) pra um possível aspecto da pessoa (ser muito burro). É fácil entender que na primeira, o nível de esclarecimento pode ser muito maior. Enquanto na segunda, a ofensa só serve para afastar a pessoa do entendimento acerca do político.
Quase o mesmo acontece quanto ao “bonzinho”. Mas neste caso, é a adjetivação de uma ação se sobressaindo. É mais ou menos como quando eu chamo certo jogador de perna de pau por ele não ser o jogador que eu queria.
Decidi deixar me chamarem de o metido a culto, o “bonzinho”, às vezes ter minha educação confundida com falsidade e ser chamado de todas essas coisas por aí.
Entendi que sou mais do que os adjetivos que me dão. Minhas falhas, sim, irei tentar enfrentá-las. Me comunicar melhor. Buscar ser assertivo. Porém, abandonar minha forma de estar no mundo, porque esse ou aquele irá se incomodar…
Desculpe-nos. Nós, os metidos a bonzinhos e cultos, não somos tão cultos e bonzinhos assim.
Não exagera.
Imagem de capa: 4Max/shutterstock
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