Por que há, em nós, um desejo imenso de amar e um medo maior ainda de viver o amor? Por que sentimos vontade de ter um amor que nos arrebate, mas não queremos correr o risco de nos machucar? É estranho como o ser humano é tão paradoxal ou, quem sabe, tão medroso ou preguiçoso, afinal, querer colher os frutos sem nenhum esforço, ou correr o risco de ter alguns frutos estragados, parece-me contraditório à própria colheita, isto é, ao amor.
Sabe como é, quem não arrisca não petisca, diz o ditado popular. Não querer correr o risco de se machucar é inconciliável com o amor. Amar é estar disposto a cair, pois sabemos que nem sempre as pessoas são o que aparentam. Mas não há como saber sem arriscar. Então, se verdadeiramente queres viver um amor, desprende-te do medo que te impede de vivê-lo.
Abrir-se para alguém a ponto de tornar-se completamente vulnerável sempre trará o risco de esse alguém nos machucar. Sendo assim, porque existe um risco inerente, devo evitar todo tipo de contato mais íntimo, de abrir o coração e mostrar os recantos mais longínquos, as tristezas mais escondidas, as angústias mais sombrias? Devo evitar sentir o deleite de um toque suave e profundo na alma? Ah! Se queres um amor, trata de arrancar as muralhas que tornam teu coração inacessível. Ninguém quer se machucar, mas, às vezes, acontece. Como disse Montesquieu, “correndo em busca do prazer, tropeça-se com a dor”.
Deixar de se envolver pelo medo de descobrir que o outro não é tão inteligente quanto imaginamos, que, talvez, durma de um jeito estranho, que não seja talvez a pessoa maravilhosa e encantadora que se mostra agora, é apenas medo. Medo de se apaixonar por todas as idiossincrasias que as formam e são exatamente dessas coisas que têm medo de sentir falta caso acabe, pois saberá que são delas e que não encontrará em outro lugar. Se queres um amor que seja inesquecível, aceita que são as coisas que apenas o ser amado possui que te faz amá-lo. Coisas que os outros chamam de imperfeições, mas você chamará de dádivas.
Achar-se mais forte por ter uma vida que subsiste apenas em si mesmo é uma fraqueza da alma que desnutre o coração. Sai do teu casulo, cheio de proteções. Sai do teu mundo de regras e perfeição, porque não és perfeito, tampouco precisa ser um pedante de coração duro que não se permite guiar pelos sentimentos sinceros de um coração que anseia por um cobertor e por palavras que apaziguem qualquer cólera.
Para que serve um álbum com apenas fotos suas? Por que ter medo de dividir um pedaço de bolo e uma xícara de café? Todos nós já tomamos café sozinhos e, sem dúvida, caso quebremos a cara, saberemos tomá-lo sozinhos novamente. Então, por que o medo? Será que ter alguém, na sua cozinha, lambendo a tampa do iogurte, te aflige tanto? Ou será que é insuportável ver os móveis da sala arrumados de um jeito diferente?
Por que esse nosso estranho medo de amar? O amor torna a vida uma bagunça e um lugar divertido, ao mesmo tempo. É complexo e só aceita desbravadores. Não há espaço para quem não queira se envolver a fundo, de corpo e alma. Não há espaço para quem não tenha paixão e loucura. Se queres um amor, sai do teu esconderijo, onde não sofre, não chora e não fica triste, e vem dançar entre os cravos e as orquídeas, onde há perfume e a vida é bela. Onde se chora até soluçar e o chão é escorregadio.
Não há certezas na vida. Não há certezas no amor. Disseram, certa feita, que o maior pecado de todos é viver a vida inteira sem conhecer o amor. Mais: por vontade própria, por medo de se machucar, decepcionar-se e sofrer. Todos nós podemos e devemos ser felizes sozinhos, mas existem coisas que só podemos sentir com o amor. Assim, deixar de sentir a magia de risos compartilhados com um amor por medo, realmente é um pecado sem perdão. E, como escreveu o poetinha:
“[…] ter medo de amar não faz ninguém feliz.”
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Imagem de capa: wrangler/shutterstock
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