Aftersun é o elogiado filme de estreia da escritora e diretora escocesa Charlotte Wells, que mora em Nova York, onde estudou cinema na NYU. Ela faz o que todo cineasta ambicioso deveria fazer em seu filme de estreia: quebra quase todas as regras, principalmente aquela que diz que o cinema é um meio de ação, de fazer.
Quase nada acontece em Aftersun, ou pelo menos nada de incomum. Uma menina de 11 anos chamada Sophie (Frankie Corio) e seu pai, Calum (Paul Mescal), passam quinze dias em um resort turco, em algum lugar à beira-mar. Eles nadam, comem, deitam-se ao sol. Sophie é inteligente e divertida, ansiando por experimentar o que as meninas mais velhas estão vivenciando – meninos, beijos e consumo de álcool.
Calum é solícito, carinhoso, reservado. Ele tenta ensinar-lhe autodefesa, preocupando-se com os perigos que aguardam a filha. Um dia, eles visitam um antigo anfiteatro grego e se lambuzam de lama vulcânica. Esse é um ponto alto da viagem de pai e filha. Aí as férias acabam e Sophie volta para a mãe, que está separada do pai. É estranho então que o filme deixe você com uma profunda sensação de dor e de perda. Como Charlotte Wells fez isso?
A história é autobiográfica, embora “história” pareça uma palavra forte – é mais como um fragmento da infância, uma tentativa de conciliar a memória com um sentimento de perda. Escolher esse tipo de ritmo para seu filme de estreia é um passo corajoso. Isso vai contra todas as tendências. Não é exatamente ousado ser chato, mas sim diferente.
Wells nos força a procurar mais profundamente as tendências e nuances enquanto ela estabelece metodicamente padrões de repetição, quase como poesia. Isso nos dá uma forte noção do estado de espírito de Sophie, sua absorção de tudo como uma esponja. Ela pode não ser capaz de interpretar tudo o que vê e ouve, mas não perde nada.
Mesmo assim, Wells não nos dá pérolas, apenas perguntas. Calum está preocupado com alguma coisa, mas Sophie não sabe o quê. Vinte anos depois, Sophie (Celia Rowlson-Hall), adulta, assiste a imagens digitais que filmou durante as férias em busca de pistas. Estes não estão resolvidos. Ficamos especulando, folheando as imagens com ela – simplesmente imaginando.
Este não é o tipo de filme que vai te entreter com uma narrativa repleta de acontecimentos mirabolantes, mas e daí? Se não tivermos espaço para os que assumem riscos, para os filmes que nos desafiam e nos deixam perplexos, perdemos o lugar da invenção, o espaço para algo novo.
De alguma forma, sem que os seus efeitos se tornem óbvios, Wells leva-nos à gravidade do que ela está a recordar. O acúmulo de pequenos detalhes cria uma forte noção de quem são esses personagens. Sentimos a dor de Calum, mesmo que não saibamos o que o aflige.
Os últimos momentos do filme oferecem uma explosão de emoção misteriosa, poderosa o suficiente para varrer as dúvidas anteriores. Aftersun rendeu a Paul Mescal a indicação ao Oscar de Melgor Ator. Além disso, uma pesquisa com 90 críticos da Sight and Sound nomeou este o melhor filme de 2022.
Confira o trailer de Aftersun:
Fonte: TSMH
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