Somos inspiração em estado de graça e apreensão… do ar que nos cerca. E do mundo que nos move. E o que se inspira é o que mantém vivo e faz seguir, mas também o que pode apontar um novo rumo. E a vida pulsa!
É por aí que a gente descobre que o melhor são as pequenas inspirações nossas de todo dia. Com a espinha ereta, o coração tranquilo, mas a mente bem aberta! Porque algumas passam discretas, mas estão ali para serem sorvidas por um olhar. É!
De repente percebemos que conseguimos respirar com os olhos e provar o sabor do som ou sentir o toque da luz… E é nessa dança dos sentidos, que mora o germe de uma nova idéia. Não se sabe ao certo o momento em que ela se apodera da alma. Cada dom a seu tempo, cada esforço a seu chão. Ora num primeiro assalto, ora num ataque final.
E não tem mais jeito, somos despertados para uma dimensão até então desconhecida, em forma e cor e função. Assim, num dia qualquer de uma semana comum, um fato corriqueiro nos dá o poder da visão além do alcance do nosso óbvio. E faz-se o entendimento, que vai motivar as futuras ações e todos os desafios que estarão por vir. Transformador. Como todo achado deve ser.
Parte deste texto escrito até aqui foi feito há alguns anos e me relembrado por esses dias. Eu me dirigia a uma turma de alunos formandos, e falava com eles a respeito de como os supostos dons por vezes são frutos de um processo de construção pessoal, que pode ser desencadeado pelos fatos mais improváveis.
Coincidências que não existem, também por esses dias, aconteceu de passar um dos meus filmes eternos, O Fabuloso Destino de Amélie Poulin… Nelson Rodrigues falava que devemos “…ler pouco e reler muito. Há uns poucos livros totais, três ou quatro, que nos salvam ou que nos perdem. É preciso relê-los…” Penso que com os filmes e com todas as artes, seja a mesma coisa. Amélie é um dos meus filmes totais. E acho que já me salvou algumas vezes. Ele fala justo das descobertas singelas e fundamentais que fazemos ao longo da nossa caminhada. De como o exercício da observação do entorno associado a uma boa dose de criatividade, que pode ser trabalhada, consegue despertar uma nova perspectiva sobre tudo. E sobre nós.
A história de Amélie, uma pessoa sabe voar e se impõe um dever, nos ensina que achar um sentido real e nobre pra vida é o mesmo que encontrar um tesouro valioso. Que tão importante quanto um talento natural, são os movimentos criados e exercidos a partir de uma escolha. Por vezes parece difícil a gente descobrir para que serve e porque veio… de verdade.
Mas talvez seja só uma questão de prestar a atenção no impacto dos nossos atos nas vidas dos que nos cercam. O que mais os deixarem felizes, talvez seja o que fazemos de melhor. E não é a isso que chamam de dom? Ao se doar tempo, energia e atenção para um ofício que pode ser modificador ou feliz para alguém, instala-se uma nova ordem interna. Se é o universo conspirando ou se tudo é só matemática, física ou qualquer outra coisa bem exata, o fato é que o que vem tem volta… E vamos ficando cada vez melhores no trato daquele exercício.
Então é preciso sempre olhar largo, ou bem pertinho. Inspirar fundo, expirar longe e ter a sensibilidade de saber que o coração pensa e a mente ama e os passos de quem se doa brilham, marcando a trilha que materializa o sonho. Compreender que o empenho pesa mais que a sorte e a ousadia irmana com o êxito, que irmana com o ponto onde se quer chegar. Onde se quer chegar? O certo é que todo dia a gente cresce e ainda pode querer e ser. Vamos, enquanto somos os senhores da nossa fantasia, do nosso agora e da nossa fé. Resta encontrar o tesouro no fim do arco-íris, que quase sempre está enterrado em nosso quintal.
.música incidental – over the rainbow.
::: As cores e os grandes olhos negros de Amélie Poulin foram inspirados nas obras do artista plástico brasileiro, Juarez Machado. Vermelho, verde e amarelo saltam da tela, nos conduzindo em amor, esperança e luz… Logo de início (spoilers leves – quem ainda não teve a experiência que é voar com Amélie, pare a leitura por aqui!), ela descobre um novo objetivo para a vida: levar a felicidade através de pequenos gestos. E segue feliz com a felicidade alheia que produz… até que o amor a encontra e começa outra jornada pessoal. O Fabuloso Destino de Amélie Poulain tem direção de Jean Pierre Jeunet, Bruno DelBonnel como diretor de uma fotografia impecável, é estrelado por Audrey Tautou e é um filme francês de 2001. Um ode ao amor entre as pessoas, entre os amantes e a si mesmo. Só vendo… :::