Por Josie Conti
Ontem, enquanto tomava um sorvete com a minha sobrinha, acontecia numa mesa próxima uma conversa familiar que envolvia a readaptação de um dos membros a rotina social após o que provavelmente seria um isolamento prolongado desencadeado por uma doença psiquiátrica e isso me fez pensar e pesquisar alguns tópicos que podem ser úteis para quem convive com essa realidade.
Segundo o Manual Merck de Informação Médica, os transtornos mentais acometem, em algum momento da vida, ao menos 20% da população mundial de menor a maior gravidade.
Quem possui um familiar ou convive com alguém que precisa ou já precisou de um tratamento assim sabe que o adoecimento pode interferir significativamente nas reações pessoais chegando até mesmo a transformá-las totalmente ao longo do tempo.
Todos os envolvidos sofrem impactos em sua rotina e em seu próprio emocional, pois a doença exige atitudes que talvez as pessoas nunca tenham tido a necessidade de tomar em suas rotinas anteriores.
Frente a esse desafio e sabendo que os familiares e pessoas realmente próximas serão as que mais terão contato com a doença- a pessoa acometida precisará deles diversas vezes- torna-se necessário um constante cuidado também com os que estão próximos.
O acompanhamento e a orientação psicológica familiar são fundamentais em todas as etapas, pois ajudarão os envolvidos a aumentar sua percepção quanto a atitudes que vão desde superproteção e infantilização ao excesso de críticas e revolta. A culpa dos familiares também pode ser uma constante, pois muitos responsabilizam-se pela doença de um filho que pode ter ligação à genética da família assim como por não conseguir estabilizar a situação como gostaria.
Seguem abaixo algumas orientações que podem auxiliar nesse processo:
Quando nos informamos ficamos mais preparados para reconhecer e lidar com os sintomas quando eles aparecem. A informação diminui o medo e a ansiedade, pois mostra como as coisas realmente são, nos dá a possibilidade de procurar ajuda mais adequada e no momento certo e, talvez o mais importante, diminui o preconceito. Saber como as coisas acontecem também nos permite ter expectativas mais realistas e respeitar melhor o tempo necessário para cada melhora.
Quanto antes as pessoas próximas aceitarem a realidade do adoecimento melhor será para o tratamento e também para a pessoa que adoeceu. Uma vez que aceitamos a doença fica mais fácil procurar e receber a ajuda necessária assim como aderir aos tratamentos psicológicos e medicamentosos que podem estar atrelados ao processo.
Alguns tratamento podem ser longos e demandar muito de todos os envolvidos. A pessoa próxima deve ajudar, mas nunca se esquecer de si e também de suas próprias necessidades. É fundamental resguardar um tempo para si mesma e suas próprias particularidades. A própria pessoa que está em tratamento, sempre que possível, também deve ter sua autonomia preservada e estimulada para evitar estresse, ressentimentos e culpabilizações desnecessárias.
Transtornos mentais graves estão associados a um aumento real nas taxas de suicídio. Tanto a confusão mental quando a o sofrimento e a sensação de falta de perspectivas podem estimular tentativas de suicídio. Esteja atento às falas e sinais. Na dúvida, não subestime e converse com a pessoa e os profissionais envolvidos sobre o assunto. A observação mais próxima e até controle dos medicamentos pode ser necessário.
A pessoa que está doente sempre terá alguém em quem mais confia. Ofereça opções e busque essas pessoas para ajudar nos passos necessários. A doença já causa sofrimento demais e todas as decisões que antes poderiam ser mais simples tornam-se mais complexas e assustadoras.
Algumas medicações psiquiátricas, como os antipsicóticos, podem ter efeitos colaterais importantes. Esteja atento às queixas da pessoa e as passe ao médico. Dependendo da situação também pode ser necessária a ajuda para o manuseio e o uso da medicação em horário correto. A recusa em tomar a medicação também deve ser conversada e discutida com os profissionais envolvidos.
A pessoa com uma doença psiquiátrica pode ter todas as áreas de sua vida afetadas. Acontecem alterações nas relações familiares, no emprego, na vida social geral. O acompanhamento no processo de reabilitação emocional e funcional é indispensável e deve ser estimulado, apoiado e ter a participação de todos os envolvidos.
Estimule a autonomia, tenha esperança no passo-a passo da recuperação e ajude a pessoa a se lembrar de quem ela realmente é. Cada passo no processo de reabilitação é uma grande vitória e deve ser comemorado. Lembre-se de focar na melhora e nos ganhos progressivos ao invés de focar nas perdas.
Muitas vezes precisamos nos lembrar da verdadeira essência do amor para lidar com as fases que podem ser as mais difíceis da vida de todos os envolvidos. Amor é presença, amor é tolerância e aceitação. Amor também é o reconhecimento dos próprios limites.
Quando falamos em transtornos psiquiátricos, o amor pelo outro não deve superar o amor por si mesmo. O desgaste emocional e físico de quem cuida também nunca pode ser esquecido. E, nessa medida e com a ajuda das pessoas próximas, os momentos de crise podem ser ultrapassados.
“A prova de que estou recuperando a saúde mental, é que estou cada minuto mais permissiva: eu me permito mais liberdade e mais experiências. E aceito o acaso. Anseio pelo que ainda não experimentei. Maior espaço psíquico. Estou felizmente mais doida.” Clarice Lispector
Nota: As orientações acima devem ser vistas como informativas e destinadas ao público geral. Elas não substituem e nem sobrepõem-se ao prescrito pelos profissionais que acompanham o tratamento da pessoa. Converse sempre com a equipe responsável sobre suas dúvidas. Nunca tenha receio de falar ou de se informar melhor.
Imagem de capa: Sergii Kovalov/shutterstock
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