Gosto muito de livros e filmes que retratam recomeços. Deve ser porque lá no fundo a gente esteja sempre recomeçando, mesmo que não perceba. Todos os dias estamos fazendo escolhas, decidindo voltar para casa, para os braços de quem amamos, para a vida que vivemos.

Escolher o mesmo amor todos os dias é um milagre. Porque todo afeto é feito de pessoas. E pessoas são incompletas e imperfeitas _ o amor também. Tem gente que imagina o amor como solução. Não entendeu que amor é construção.

Existe um tempo em que o amor amadurece. Chico Buarque chamou esse tempo de “Tempo da Delicadeza”, e definiu lindamente como o “tempo que refaz o que desfez”.

Não importa de que matéria é feito seu amor. Você nunca poderá controlar ou evitar que algumas lascas ou rachaduras aconteçam durante o percurso. E quando isso ocorrer, você terá duas opções: partir ou permanecer.

E é nessa hora, no instante em que você decide ficar, que o amor cria raízes. É nessa hora que você entende que entrou no “Tempo da Delicadeza” e terá que refazer o que foi desfeito_ de que forma for.

Ter que escolher talvez diga mais sobre você do que não ter que fazer escolha alguma.
Quando você descobre a razão que te faz permanecer, você começa a decifrar os motivos que te ligam àquela pessoa. Aquilo que faz o amor ser suficiente para você querer voltar para casa todos os dias.

E são essas novas razões que justificam e validam aquelas outras, antigas… pelas quais seu coração se apaixonou. Pois agora você já não enxerga apenas beleza; você percebe os defeitos e tem consciência das lascas.

Então você entende de fato o que são “promessas matrimoniais”, muito além de “na alegria e na tristeza até que a morte nos separe”.

Permanecer na estabilidade diante das provações do tempo é aceitar o amor como um emaranhado de angústias, intimidade e gentilezas. É compreender a contradição que existe no que gera prazer e dor. É ser paciente com o tempo de esperas, em que o amor atravessa o deserto do tédio e da rotina. É acreditar que ainda há o que se esperar mesmo quando esgotaram-se todas as possibilidades.

É entender que ninguém completa ninguém. O copo que está pela metade permanecerá meio vazio. O amor vem dar sabor, mas não tem vocação de plenitude.

O amor moldado pelo tempo ensina. Mas você tem que se permitir vivenciá-lo.
Tem que serenizar a alma e renovar os votos_ acreditando no tempo que refaz o que desfez…

Imagem de capa: wavebreakmedia/shutterstock

Fabíola Simões

Escritora mineira de hábitos simples, é colecionadora de diários, álbuns de fotografia e cartas escritas à mão. Tem memória seletiva, adora dedicatórias em livros, curte marchinhas de carnaval antigas e lamenta não ter tido chance de ir a um show de Renato Russo. Casada há dezessete anos e mãe de um menino que está crescendo rápido demais, Fabíola gosta de café sem açúcar, doce de leite com queijo e livros com frases que merecem ser sublinhadas. “Anos incríveis” está entre suas séries preferidas, e acredita que mais vale uma toalha de mesa repleta de manchas após uma noite feliz do que guardanapos imaculadamente alvejados guardados no fundo de uma gaveta.

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