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O que é obesidade?
Como as pessoas encaram, relacionam-se e tratam a obesidade?
Normalmente, o obeso é visto como uma pessoa levemente disfuncional socialmente, que não se adapta às normas-padrão estéticas devido a um certo descontrole em relação à comida.
Mas, o que há com as pessoas obesas? Distúrbios hormonais? Excesso de apetite? Gula? Sem dúvida, em alguns casos esses motivos podem estar presentes. Mas, certamente, a obesidade não é apenas uma questão de gula, de hormônios alterados ou de excesso de apetite: ela reflete, muitas vezes, os estados emocionais subconscientes que se fixaram na pessoa devido aos seus conflitos e incompreensões afetivas e existenciais, condições estas que levaram-na estabelecer uma relação desequilibrada com o seu corpo e/ou com a comida.
Partindo desse pressuposto de que a obesidade, muitas vezes, tem uma base emocional subconsciente, é preciso abordar terapeuticamente e pensar na obesidade como um processo que necessita de autoconhecimento e de transformações psicológicas e comportamentais para a sua real solução.
Todos sabemos dos infinitos e sempre novos métodos e sistemas de emagrecimento oferecidos por aí e de quanto as pessoas tentam e se esforçam para seguir dietas e manterem-se esbeltas. De um lado, temos um modelo social estético neurótico, com padrões corporais criados por formadores de opiniões igualmente neuróticos ou baseados em interesses corporativos, como é o caso da indústria da moda. Por outro, temos a ignorância consensual sobre os processos orgânicos, psicossomáticos e comportamentais que geram a obesidade. Sendo assim, precisamos abordar a obesidade de uma forma mais realista, inteligente e estrutural.
Discutindo possibilidades
Como toda doença ou condição comportamental negativa, a obesidade também tem múltiplas origens psicológicas; ou seja: ainda que boa parte das pessoas tenha se tornado obesa devido a condicionamentos psicológicos, os condicionamentos (as origens emocionais) normalmente são diferentes de pessoa para pessoa.
Portanto, se realmente se deseja tratar um obeso, é preciso conhecer a sua história de vida, o seu padrão familiar e compreender os seus conflitos interiores e condicionamentos psicológicos que o levam a ser obeso. E ainda que haja um distúrbio hormonal associado à obesidade de alguém, é preciso pensar e investigar juto com essa pessoa sobre os porquês de seus desequilíbrios glandulares.
Claro que existem obesos simplesmente porque existe um componente de má alimentação envolvido – que está baseado em excesso de carboidratos e gorduras -, mas para estes apenas uma boa reeducação em seus hábitos alimentares é o suficiente.
Um esboço sobre tipologias relativas à obesidade
A família obesa
Alguns obesos desenvolvem-se em “ambientes familiares obesos”. O padrão familiar envolve ou baseia-se na alimentação farta, no sentido de abundância nutricional, no prazer de comer e estar reunido ao redor de uma mesa farta.
De alguma forma, está implícito para essa família que “encher a barriga” em família dá o sentido de preenchimento emocional, de afeto e comunhão grupal. Claro que depois que os filhos se casarem, irão normalmente manter essa noção (condicionamento psicológico), que tende a levar à formação de um novo núcleo familiar obeso.
Ao tratar um obeso com esse perfil – seja da primeira ou das demais gerações -, é preciso questioná-lo sobre o tipo de ambiente familiar no qual viveu, sobre quais eram as impressões emocionais implícitas nesse ambiente e se essas impressões refletem realmente um ambiente emocional saudável, ou se camuflam estados e necessidades emocionais mais profundas dos indivíduos dessa família.
Meu corpo, minha fortaleza
Um certo perfil psicológico ligado à obesidade é o da sensação de proteção e de segurança de estar dentro de si, protegido por uma massa externa.
Nesse caso, o excesso de alimento tende a representar tanto a nutrição “maternal-familiar-protetiva”, como o “material” que constrói a “barreira”contra os ataques exteriores. Comer significa nutrir-se emocionalmente e construir continuamente as barreiras contra as agressividades, especialmente as de natureza física.
O obeso que tem traços desse perfil precisa perceber como vem usando o alimento para cumprir funções de relacionamento social de forma inadequada e que, na verdade, lhe causará danos severos, pois tornar-se obeso pode torná-lo ainda mais incapacitado e vulnerável, devido à sua crescente imobilidade. Confrontar perigos e situações agressivas exige uma postura madura, responsável e destemida e não exatamente um “corpo-muralha”.
O eterno bebê
Algumas pessoas mantêm-se presas emocionalmente na condição de eternos “bebês”, que desejam a nutrição maternal para sempre. O alimento lhes relembra essa nutrição, e essa condição é mantida como o foco de vida, de satisfação crucial para o seu desejo perene de nutrição emocional e cuidados afetivos maternos.
Esse tipo de pessoa come sempre e continuamente, tornando-se o “obeso-padrão”, aquele passa a imagem de que “é gordo porque come demais”.
Nesse caso, a pessoa precisa de meios para conhecer seu padrão emocional disfuncional ligado à sua forma de comer. Precisa também compreender fundamentalmente que sua nutrição vem de si mesma, que ela não pode ser dependente eternamente da nutrição de outrem, e que precisa amadurecer e se tornar responsável por si mesma e pela sua manutenção psicológica interior.
A eterna nutriz
Da mesma forma que existe o “eterno bebê”, existe a “eterna nutriz”, aquela pessoa que mantém um padrão de massa corporal excedente devido a um padrão emocional subconsciente de alimentar e acolher afetiva e “maternalmente” os demais.
Normalmente isso se vê mais em mulheres, naquelas que têm um perfil nutridor, como a típica “mamma” italiana: com a expectativa de darem sempre aos “seus filhos” (quem quer que sejam estes: seus filhos reais, ou os seus filhos “adotados” afetivamente), de nutrirem seus “bebes”, elas condicionam-se a acumular alimento em seu corpo, que literalmente se transforma em massa corporal, que é um símbolo visível para os outros de sua condição eterna da “grande mãe nutridora”.
Para essas pessoas é uma condição difícil a de admitir que precisam deixar de ser “as mães nutridoras do mundo”, se quiserem deixar de ser obesas, e, normalmente, são essas que tendem a desenvolver doenças degenerativas como o diabetes tipo 2, os problemas vasculares nas pernas, os distúrbios articulares em joelhos e pés, entre outros, devido ao papel estático e servidor de dona de casa e mãe eterna.
É preciso crescer e deixar crescer, desprendendo-se dos filhos, sem medo de encontrar a casa vazia; é preciso viver, construir o seu eu e aprender a relacionar-se socialmente além de sua própria família (o pequeno núcleo que representa o “lar interno”), enfrentando e conhecendo o mundo, onde vive a coletividade maior na qual ela deve se desenvolver.
A opulência alimentar
Atualmente, as sociedades tecnologicamente avançadas e economicamente prósperas, baseadas no “mercado de consumo”, têm criado, através da mídia, um estímulo crescente ao consumo excessivo de alimentos, dando ênfase às delícias industrializadas e da mesa em geral, inclusive agregando status positivo à culinária sofisticada que vem se popularizando sob o termo “gourmet”.
Para as camadas mais esclarecidas, o fato de achegar-se mais à mesa e desfrutar mais frequentemente de lautas refeições é compensado pelas atividades constantes em academias e afins. O padrão crescente “estilo gourmet” vem acompanhado dos estreitos e exigentes padrões estéticos da alta sociedade, por isso, é mais raro encontrar pessoas de perfil econômico elevado tornando-se obesas. A isso agrega-se o fato de que as pessoas mais esclarecidas tendem a cozinhar com ingredientes muito menos calóricos e utilizar alimentos de padrão nutricional muito mais saudáveis, o que significa menor consumo de gorduras e carboidratos e maior consumo de fibras, vitaminas, sais minerais e enzimas que tendem a equilibrar metabolicamente as glândulas e o restante do organismo.
Por outro lado, as camadas menos esclarecidas, têm tido maior acesso aos alimentos industrializados e aos produtos alimentícios não-essenciais (guloseimas), sem terem o mesmo conhecimento sobre propriedades nutricionais, consumo calórico e sobre substâncias essenciais reguladoras do metabolismo, como sais, vitaminas, enzimas, pró-bióticos etc. Ao mesmo tempo, têm muito menos impressos os padrões estéticos estreitos de linha corporal e muito menos acesso aos meios de manutenção dos mesmos, como a academias, personal trainers e similares. Assim, a opulência alimentar aqui não vem acompanhada de contrapartes reguladoras, o que resulta num crescente padrão de obesidade para a população média, especialmente das camadas menos favorecidas, as quais têm sido um novo nicho para a indústria alimentícia e as mídias associadas.
O alimento como recompensa
Um aspecto muito mais óbvio, mas não menos importante, é o conceito do alimento como recompensa.
É comum encontrarmos em alguns tipos de alimentos, como doces, massas e guloseimas variadas, a “satisfação-recompensa” depois de termos feito esforços no trabalho, nas atividades domésticas, ou nos estudos, com a sensação de “Eu mereço isso!”
É claro que a satisfação, o prazer e o bem-estar, assim como o descanso e o lazer, fazem parte da vida humana, e comer, descansar e ter momentos de paz e satisfação com amigos e familiares são pequenas jóias que tornam a vida mais feliz.
Mas, há um conceito ligado à recompensa alimentar que é utilizado, muitas vezes, de forma pouco construtiva e inteligente, tornando, pelo contrário, certas pessoas dependentes do alimento como se este fosse a fonte final de prazer e recompensa na vida.
É bastante comum vermos mães que prometem delícias doces aos filhos, caso estes comam toda a comida que está no prato, ou guloseimas, caso cumpram corretamente suas tarefas domésticas ou escolares.
Em outros casos, pais trazem caixas de doces ou de chocolates aos filhos, como reconhecimento pelo comportamento polido e os elogios recebidos na escola, ou como forma de compensar a sua ausência, devido ao excesso de trabalho e compromissos sociais.
Todos esses comportamentos condicionam a criança a vincular os resultados positivos de suas ações aos alimentos, especialmente aos hipercalóricos e saborosos, como é o caso dos doces.
Com o tempo, como os sabores acentuados são viciantes (e mais especialmente o açucar concentrado, presente em muitos doces), a criança vai substituindo as faltas afetivas (ausência do pai ou da mãe ou de ambos) e o justo prêmio pelos seus esforços pela sensação intensa do paladar e em especial dos doces.
Podemos ver aqui a imagem da adolescente, que mesmo entediada, vai à geladeira inúmeras vezes em busca de guloseimas, e que passa a “beliscar” o tempo todo. Ao longo do tempo, teremos uma adolescente obesa, insatisfeita emocionalmente e literalmente viciada em comer.
Uma pessoa com esse perfil precisa recuperar o sentido real de satisfação e também o de recompensa.
A satisfação interior e a plenitude afetiva são corretamente alcançadas dentro da esfera do reconhecimento alheio (especialmente dos pais e educadores), quando do sincero e espontâneo cumprimento dos compromissos e comportamentos sociais de forma ética e humana pela pessoa; igualmente se dão através da comunhão humana e espiritual (no sentido interior, e não religioso formal) do indivíduo com a coletividade e a Existência.
Do mesmo modo, a forma correta de recompensa resulta dos mesmos âmbitos e aspectos de reconhecimento moral pelo dever cumprido: o reconhecimento e a aprovação alheia correta (em especial de pais e educadores) que possuem um sentido moral saudável, levam embutidos o sentido caloroso da aceitação e do afeto, que preenchem o indivíduo de sentimentos de bem-estar, segurança e de boa auto-estima.
Assim, o erro essencial que leva a esse tipo de obesidade é transferir o sentido de satisfação e de recompensa para elementos materiais de prazer imediato – como os alimentos saborosos e as guloseimas -, ao invés de devolver à criança ou ao indivíduo em geral o reconhecimento moral, o seu valor interior, e a sua aceitação e sentido de pertencimento saudável à coletividade.
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Existem outros perfis psicológicos que levam à obesidade, por isso, como dito anteriormente, é preciso interessar-se genuinamente pela pessoa que deseja se compreender e deixar de ser obesa, sempre lembrando que cada caso está baseado em condições e contextos psicológicos referentes à própria vida da pessoa.
Fonte indicada: Epoch Times
Imagem de capa: SeventyFour/shutterstock