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Onde habita o amor

Um grande amor não tem nada de simples. Quantos eventos aleatórios (ou não) são necessários para nos tornar aptos a experimentar esse amor? Daquele que desafia nossas estruturas solidificadas por inúmeras desilusões e desencontros. Quando percebemos a presença desse amor já não há tempo para usar dos velhos artifícios numa tentativa de descartá-lo. Não conseguimos mais manter as defesas de antes. O nosso coração está irremediavelmente aberto.

A alquimia de um grande amor está na imprevisibilidade de sua origem. Dois seres completamente distintos que se aproximam com o objetivo de se amarem até que a transformação de apenas um deles ou de ambos esteja completa. Essas relações não se resumem apenas a carma ou predestinação. O livre arbítrio está sempre presente. As nossas escolhas irão determinar o momento e o nível da transformação a que seremos submetidos.

Então, como reconhecer a presença desse tipo de amor? Seria o amor descrito nos ensinamentos budistas como incondicional, ou seja, aquele no qual se pensa primeiro na felicidade do outro? Essa seria a essência do amor não egoísta. Ou, seria um amor que corre nas veias, como o descrito em uma das poesias de Rumi? Tão visceral que se apossa de tudo. Até mesmo das palavras.

Um grande amor, no mínimo, deveria nos fazer sentir como se estivéssemos em nossa casa. Cada canto protegendo nossa história de amor. Cada objeto guardando nossas memórias. Cada visita honrando nossa escolha de estarmos juntos. Cada reforma expondo nossa transformação interior. Cada filho revelando nossa fé. Cada mudança de casa desafiando o nosso apego.

Seria algo que poderia ser descrito assim: “Abrimos a porta. Tiramos o sapato com um suspiro de alívio. Andamos descalços. Sentimos necessidade de abrir as janelas. Resgatamos aos poucos quem somos sem máscaras ou julgamentos. Soltamos o cabelo. Afrouxamos a gravata. Queremos liberdade das amarras que nós mesmos criamos. Beliscamos algo ainda de pé. Cantamos alguma música que ouvimos no caminho.

Repetimos o refrão até cansar. Ficamos na penumbra. Esperamos o pôr do sol. Honramos nosso pequeno altar. Acedemos velas perfumadas. Sentimos alegria nesses pequenos rituais. Conhecemos cada canto. Sabemos como fazer funcionar o que apresenta defeito. Aproveitamos as sobras do almoço. Guardamos o que é importante. Descartamos o lixo. Planejamos uma reforma. Vamos deitar cansados. Estamos juntos novamente. Seguros em nosso lar”.

Que todos os seres tenham a experiência de um grande amor. Que todos os seres sejam transformados pela força poderosa do amor. Que todos os seres possam se sentir verdadeiramente em casa.

Adriana Abraham

Advogada e escritora, com cursos nas áreas de yoga e meditação. Carioca, residindo atualmente em Brasília.

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Adriana Abraham

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