Na nossa sociedade capitalista, há a concepção de que presentes significam necessariamente amor e afeto. Dessa forma, os gestos genuínos que esboçam amor e carinho são substituídos por presentes e diversas atividades.
Hoje, a criança feliz é aquela que tem e faz de tudo, desde a natação, até o inglês, o francês e também o tênis. Nossas crianças sabem fazer muitas coisas, mas possuem pouco espaço dentro de suas próprias casas.
Pais sempre muito ocupados para seus filhos e que, ao mesmo tempo, ocupam demais os filhos, como forma de “suprir” essa falta. Não estamos, aqui, tentando culpabilizar os pais, mas promover uma reflexão sobre a relação pais e filhos, a qual é muito importante e tem sido deixada cada vez mais de lado.
Por mais que a criança tenha mil e uma atividades, aquela conversa, aquele abraço, aquele cuidado não são dispensáveis. Nós precisamos disso, precisamos saber que alguém zela por nós, precisamos ter um lugar para não só descansar no final do dia, mas para conversar e dividir os acontecimentos.
Os filhos também precisam desse espaço; a atenção não deve ser apenas de fora, mas também dos pais. Por isso, encher o seu filho de presentes não significa necessariamente que ele se sinta amado, presentes, dinheiro para comprar roupas, ir a festas, ou simplesmente ser um pai-mãe liberal; nada disso resume de que o seu filho necessariamente precisa.
Assim como em um relacionamento amoroso, presentes e jantares caros não sustentam um relacionamento; é preciso, nas relações entre pais e filhos, ir além, abrir espaço para diálogos, permitir que os filhos compartilhem suas histórias, seus anseios e suas angústias que, muitas vezes, ficam retidos pela tal “falta de tempo”. Por mais que esse desejo de se expressar não seja tão nítido, é preciso estimular essas relações de forma positiva.
Recentemente, a série “Os treze porquês” nos mostrou a importância das relações não só no âmbito social, mas também familiar. Nossas crianças e adolescentes querem ter um espaço de acolhimento dentro de seus lares, querem ter alguém para os defendê-los, ao invés de apenas julgá-los e culpabilizá-los.
Vejo muitos adolescentes que têm de tudo, desde o melhor celular, até a melhor roupa, o melhor tênis, as melhores viagens, mas que reclamam por não terem ninguém para ouvi-los. Pessoas que estão angustiadas e não sabem o que fazer com o seu sofrimento, que buscam alguém para partilhar, mas não sabem quem procurar e acabam vagando em busca de alguém que os escute, que acolha as suas angústias.
Não que a culpa seja da família, o que quero dizer é que, muitas vezes, os pais não se dão conta dessa necessidade seja pela rotina, pela correria, ou por inúmeras questões. O alerta vem como forma de voltar-se para essas relações e que os pais busquem fortalecer o relacionamento com os seus filhos, não por meio do dinheiro, de presentes, agrados e permissões, mas por meio da escuta, do companheirismo e da presença.
Nada disso supre a falta de um abraço caloroso; nada paga o colo no final do dia e o ombro amigo que permite chorar. Nada anula a presença e o cuidado. Afinal, amamos sentir que alguém zela por nós.
Imagem de capa: iko/shutterstock
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