Fabíola Simões

Para proteger meu equilíbrio, é ok colocar limites. É ok bloquear. É ok ficar em paz com isso

Tem gente que não liga para água fria. Eu não tolero. Admiro quem vai à piscina e, sem a menor cerimônia, pula de uma vez naquele gelo paralisante. Por outro lado, adoro montanha russa. Quanto mais cheia de descidas íngremes e loopings, melhor. Meu marido apavora. As mãos suam, a boca seca, as pernas tremem. Pra ele, é um sofrimento. Tem gente que adora café, mas tem dor de estômago se beber muito. Outros passam mal com pimenta. Há os que tomam cerveja e ficam com dor de cabeça. Há aqueles que bebem leite feito bezerro e passam bem. Tem gente que dá um boi pra não entrar numa briga, tem gente que dá uma boiada para não sair.

O que quero dizer com tudo isso é que ninguém, além de você mesmo, pode saber o que te deixa confortável ou desconfortável. Ninguém, além de você mesmo, tem condições de dizer quais são os seus limites, o que você pode tolerar, o que te faz bem, o que você digere, o que te deixa em paz.

Só você conhece seus limites. Só você sabe aquilo que te afeta, te faz mal, te irrita, te exige mais do que o normal, te machuca, te causa dor, te tira do sério, te faz ter péssimas lembranças, te perturba, te atinge, traz à tona uma versão sua que você não gosta. E só você pode se proteger, se preservar, colocar os pingos nos is e saber até onde você pode ir.

Está tudo bem não ler todas notícias. Está tudo bem dizer “não” àquela solicitação. Está tudo bem não gostar de livros densos. Está tudo bem adorar séries levinhas e engraçadas. Está tudo bem não falar de política nem futebol. Está tudo bem querer ficar sozinho. Está tudo bem não gostar de balada. Está tudo bem odiar montanha russa. Está tudo bem cancelar um compromisso. Está tudo bem não querer ficar perto de alguém que te machuca. Está tudo bem não frequentar um lugar que você não gosta de ir. Está tudo bem se colocar em primeiro lugar.

Por que você continua assistindo a um programa que só tem notícias que te fazem mal? Por que você continua entrando em grupos de discussões que só afrontam seu bem estar? Por que vc continua de conversinhas com aquela pessoa que brinca de io-iô com você, enquanto faz seu coração em pedacinhos? Por que você se desagrada para agradar aos outros? Por que você não consegue dizer “não” para aquela solicitação quando tudo que você queria era estar em outro lugar, fazendo outra coisa? Por que essa mania de não se proteger, não se poupar, não se resguardar?

Só é preciso uma pessoa para cuidar de você: Você mesmo. Mas para conseguir se cuidar, é preciso se conhecer. Saber até onde você consegue ir, até onde dá conta, até onde pode mergulhar. Cuidar é conhecer seus limites, proteger sua energia, blindar seu bem estar. Cuidar é se afastar do que te perturba, te desgasta, te desequilibra.

Algumas vezes temos que colocar nossa afeição por alguém em banho maria para que possamos nos lembrar de que merecemos mais. Algumas vezes temos que colocar o que sentimos por alguém em segundo plano para que coloquemos a nós mesmos em primeiro lugar. Quando gostar de alguém nos faz em pedaços, é hora de recuar, reconsiderar, afastar, até mesmo bloquear.

Para proteger minha energia, não vejo mal nenhum em silenciar grupos, não me envolver em discussões, fugir de notícias sangrentas, bloquear pessoas que interferem no meu equilíbrio e não mergulhar em águas muito geladas.

Não enxergo isso como fuga, e sim como autoconhecimento e autopreservação. Com a maturidade, tenho adquirido compreensão da minha natureza, e aprendido a reconhecer as coisas que quero ver plantadas em meu terreno. Nem tudo me cabe, e essa percepção é pessoal e relativa, por isso cabe a você também reconhecer aquilo que lhe afeta, equilibra, motiva ou desagrada. Cabe a você descobrir o que faz bem para sua saúde física, emocional e espiritual e só preservar o que deve prevalecer, tendo a coragem de se autorizar escolher o que é melhor para você.

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Photo by Lacie Slezak on Unsplash

Fabíola Simões

Escritora mineira de hábitos simples, é colecionadora de diários, álbuns de fotografia e cartas escritas à mão. Tem memória seletiva, adora dedicatórias em livros, curte marchinhas de carnaval antigas e lamenta não ter tido chance de ir a um show de Renato Russo. Casada há dezessete anos e mãe de um menino que está crescendo rápido demais, Fabíola gosta de café sem açúcar, doce de leite com queijo e livros com frases que merecem ser sublinhadas. “Anos incríveis” está entre suas séries preferidas, e acredita que mais vale uma toalha de mesa repleta de manchas após uma noite feliz do que guardanapos imaculadamente alvejados guardados no fundo de uma gaveta.

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