Por Renate Keller Ignacio
Via Aliança pela infância
Nos primeiros anos de vida a criança explora seu corpo e o mundo ao redor brincando. Brincar nesta fase significa experimentar diversas possibilidades de movimento, de manuseio de objetos, de interação com outras crianças, de sensações através dos sentidos, sempre partindo da iniciativa própria de cada criança. Brincar acontece inesperadamente, inconscientemente, sem intenção utilitária, mas a partir da alegria, da curiosidade, da vontade de agir e interagir. Quando nos adultos observamos crianças pequenas brincando livremente, somos surpreendidos à cada momento. As brincadeiras parecem brotar do corpo e da alma da criança espontaneamente, numa riqueza de transformações, sempre aparecendo novas formas e significados. Misturam-se experiências reais vividas na família, na escola ou na comunidade com a fantasia da criança e com os movimentos corporais.
Por que isto é importante para desenvolver resiliência?
A capacidade de resistir às intempéries da vida e sair fortalecido de crises graves, depende do desenvolvimento de uma confiança inabalável no sentido da vida, e do sentimento de fazer parte de um todo maior. Isto as crianças experimentam na infância ao brincar: na brincadeira a criança mergulha no mundo da imaginação que por sua vez tem a origem nas forças criativas atuantes no corpo em desenvolvimento. Tudo é interligado, as coisas tem inúmeros significados, inúmeras soluções ou possibilidades. Frustrações podem ser vividas e superadas, flexibilidade é exercitada. A criança que brinca a partir de si mesmo, se acalma, respira profundamente e entra num estado de bem estar, onde ela sente uma profunda confiança na existência. Esta confiança se transforma na idade adulta em fé na vida, em fé em si próprio e no seu destino. Esta fé é a base da resiliência.
Por que brincar é importante para desenvolver coragem?
Coragem é uma força do “cor”ação que possibilita o adulto levar uma ação para frente, mesmo quando tem obstáculos, ou desafios assustadores. Coragem não é a ausência do medo, mas a força que faz você persistir, apesar do medo, porque você tem a convicção que o objetivo é importante. Esta força de vontade que não desiste tem a sua fonte no brincar. Brincar é ação, ação física, ação imaginativa, é movimento. O polo oposto é a reflexão, o pensar que necessita distancia da ação, que necessita da cabeça fria. Se a criança pode viver no polo do movimento, ou seja brincando sem que exigimos dela reflexão, então ela fortalece este polo caloroso que é a base da coragem. Assim quando ela cresce e desenvolve cada vez mais a atividade pensante, reflexiva ela terá um equilíbrio entre os dois polos. Isto é principalmente importante na nossa sociedade atual que é regida unilateralmente pelo intelecto.
E a criatividade?
Quem é criativo conseguiu salvaguardar um pouco de sua infância para a vida adulta. Quem tem criatividade consegue olhar para as coisas com olhar novo, sem preconceito, com olhar de criança. Ele consegue fazer associações inesperadas, consegue ver um fato de inúmeros lados sem se fixar num único ponto de vista. Isto se aprende brincando, porque brincar é justamente isto: fazer de um prato um chapéu, ver numa caixa de papelão um teatro de fantoche, ou pegar um pano qualquer e amarrando alguns nós transformá-lo numa boneca.
Por Renate Keller Ignacio – Conselheira da Aliança pela Infância, professora Waldorf, gestora de Desenvolvimento Institucional da Associação Comunitária Monte Azul e professora de música.
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