Tenho uma posição ambígua em relação às ondas. Sejam elas culturais, políticas, artísticas, de vestuário. Em princípio torço o nariz para topos de listas, cds de platina, oscars, campeões de ibope. Talvez por não gostar da ideia de ser rebanho, isto é, ir para aonde a massa vai.
Tento pensar com a minha cabeça. Manter a ideia, ou ilusão, de que sou eu quem decide. Eu decido se vou gostar do filme, do livro, do tênis. Se a maioria compra carro de cor prata, com certeza comparei um de cor vermelha. Confesso que tenho uma quedinha pelo minoritário. Um amorzinho pelo paralelo.
Esse gosto vem desde a infância. Foi uma luta brava me vestir de jeito personalizado. Quando todas as coleguinhas apareciam com sandalinhas, eu aparecia calçando botas. Mamãe queria morrer de desgosto. Mais tarde, a teimosia em ser diferente saltou dos objetos para as escolhas intelectuais.
Adolescente, preferia ler Machado de Assis, Dostoiévski, Eça de Queirós aos autores mais populares. Que ninguém me empurrasse livros da moda, leituras da onda. Na juventude, se eu podia assistir a filmes do Michelangelo Antonioni, para que gastar ingressos com um Steven Spielberg? Meu lema era: quanto mais complexo melhor. Quanto mais trabalhoso, mais valioso.
Mas ondas de amadurecimento foram corrigindo a rota. Um dia me perguntei: por que a maioria estaria necessariamente equivocada? Será que não há um mérito espetacular em conseguir agradar a muitos? Então percebi que a minha postura de remar contra a maré tinha algo de arrogante. Alguma coisa de nariz empinado.
Não que eu tenha virado uma maria-vai-com-as-outras, ou um zé-vai-com-as-mídias. Prezo meus critérios, respeito meus parâmetros. O que mudou é que fiquei menos excludente. Sigo lendo Machado de Assis, mas também curto blogs ligeiros. Vencido o preconceito, hoje aprecio o Spielberg e continuo me deleitando com o Antonioni.
Descobri a minha onda: não desprezar praia alguma. Transitar entre as mais populosas e as pouco frequentadas. Entender as famosas e as anônimas. Acatar minha régua de valores sem desmerecer réguas alheias.
Surfar nesse comportamento exige treino constante e considerável determinação. Mas o que quero mesmo é ser a senhora de Copacabana e também da Praia Grande. Ter um ouvido na Orquestra Sinfônica e outro na bateria da Mangueira.