“Perdi meus pais num intervalo de 17 minutos por falta de oxigênio, em Manaus”, relata empresária

A empresária Muna Amado Ali Hajoj, de 41 anos, que perdeu os pais por Covid-19 na recente crise de saúde em Manaus, deu um emocionante depoimento para Kizzy Bortolo, da revista Marie Claire. Ela conta que eles faleceram no intervalo de 17 minutos por asfixia causada por falta de cilindros de oxigênio e acusa as autoridades de negligência pela escassez desse item básico na rede de saúde da cidade.

“Meus pais, Amado Ali Hajoj e Zahieh Abdel Karim Hassan Hajoj, eram comerciantes e estavam casados havia 46 anos. Ele tinha 75 e ela, 65. Vieram da cidade de Bani Naeem, na Palestina, nos anos 1970. Meu pai trabalhava como mascate. Foi preso e torturado na guerra com Israel e resolveu fugir dali. Primos e outros parentes no Brasil o ajudaram a vir. Depois buscou minha mãe, de quem já estava noivo. Sou a filha mais velha de três, nasci em 1979 em Manaus.”, diz a empresária no início de seu relato.

Ela conta que, desde que a pendemia foi decretada, assumiu a confecção da família. Seus pais e seus irmãos, que moravam todos juntos, ficaram isolados por 9 meses, sem sair de casa, para evitar o contágio da Covid-19. Mesmo com tantos cuidados, seus pais começaram a apresentar sintomas de Covid-19 na véspera de Natal.

“No início, montamos uma semi-intensiva em casa para eles não precisarem ir para o hospital — que já estavam lotados em toda a cidade. Mas não teve jeito. Com muita falta de ar, meu pai deu entrada no hospital no dia 30 de dezembro e minha mãe, em 5 de janeiro – ambos por orientação médica. A princípio, foram para um hospital particular, mas decidimos transferi-los para o Hospital Universitário Getúlio Vargas, que é mais preparado em termos técnicos e é estão os melhores médicos de Manaus — são médicos que formam médicos. Com a transferência, ficamos mais tranquilos, até sabermos da falta de oxigênio nos hospitais da cidade.”, relatou Muna.

A empresária ainda falou sobre a esperança que seus pais tinham de superar a doença, “Um dia antes de falecer, minha mãe recebeu a notícia da gravidez da minha cunhada e, muito emocionada, prometeu se esforçar para melhorar logo e sair daquele hospital para conhecer o novo bebê da família. Era um sonho conhecer um filho de meu irmão, já que ele era o único que ainda não tinha dado um neto a eles — minha irmã e eu já temos filhos. Meus pais tinham muitas esperanças de vida. Lutaram bravamente contra essa doença.”.

Segundo Muna, sua mãe foi transferida da UTI no final da tarde de 13 de janeiro e, no dia seguinte, faleceu por asfixia. Seu pai faleceu minutos antes, da mesma forma. De acordo com um amigo da família, que viu o atestado de óbito, as mortes aconteceram em um intervalo de apenas 17 minutos.

Ela ainda fala ainda sobre o momento em que recebeu a notpicia do falecimento dos pais. “Me falta o ar quando lembro de tudo que aconteceu. Os médicos que cuidaram dos meus pais nos deram a notícia do óbito com lágrimas nos olhos. Na UTI onde meu pai estava, faleceram mais quatro pessoas; na enfermaria, mais quatro entubados. Todos precisando muito de oxigênio.”

“Catorze de janeiro foi o dia mais difícil da minha vida. Às 9h21 da manhã, recebi uma ligação da minha prima Salwa, que é cardiologista do hospital Getúlio Vargas, dizendo para eu ir até lá com urgência. Ela só me disse que havia faltado oxigênio no hospital. Nessa altura, ela já sabia que eles tinham falecido, mas precisava que eu me mantivesse calma.

“Eu disse à minha prima que havia um cilindro de oxigênio de 50 litros na casa dos meus pais. Troquei de roupa rápido e, ao mesmo tempo, liguei para o meu irmão para descer com o cilindro que eu levaria comigo. Quando cheguei ao hospital havia três repórteres na porta. Salwa veio me encontrar na recepção. Novamente ela falou que faltou oxigênio no hospital e disse que meus pais não resistiram. Eu gritei: ‘Como assim, Salwa? Os dois morreram?’. Acho que morri junto por alguns segundos. Nem no meu pior pesadelo aquilo poderia ser real! Eu só gritava: ‘Os dois não!’. Queria acreditar que aquilo fosse mentira ou um equívoco! Gritava que a minha mãe estava melhorando, que já ia receber alta. Salwa tentava me explicar que o oxigênio no estado que os dois estavam era essencial.”, finaliza Muna Amado Ali Hajoj.

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Redação Conti Outra, com informações de Marie Claire.
Foto destacada: Arquivo Pessoal.







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