O controle das emoções é conquista que depende de cada uma das vivências a que somos expostos desde o nosso nascimento. Nossa primeira forma de comunicação com o mundo é expressa pelo choro que, por sua vez, é consequência de algum desconforto. Choramos porque algo interfere em nosso bem-estar. Choramos porque estamos com fome, frio, calor, com a fralda suja ou molhada. Choramos porque esse é nosso único recurso de interlocução; o único jeito que temos de iniciar uma relação social com os indivíduos no entorno: em geral, nossos pais.
Ignorar o choro de um recém-nascido é por si só um ato de violência. Um bebê cujo choro é ignorado, vai formando um repertório de comunicação baseado nas experiências de negligência física e afetiva; torna-se reativo a situações de abandono e vai moldando seus mecanismos de conseguir atenção de forma deturpada, numa tentativa instintiva de ser socorrido, acalentado ou atendido.
Além do choro, o bebê manifesta suas emoções por meio de reações físicas, baseadas em interações sensoriais. Muito cedo o bebê reconhece a voz da mãe e, caso tenha tido um pai presente durante a gestação, reconhecerá sua voz também. Os pequenos costumam ficar mais agitados se forem expostos a ambientes barulhentos e cheios de estímulos visuais. Bem como, podem ser acalmados com música clássica, canto de passarinhos ou sons da natureza. O banho é o momento mais rico do ponto de vista sensorial, afetivo e social estabelecido entre o bebê e quem se responsabiliza por cuidar dele. A amamentação é talvez a maior oportunidade que a criança tem de estabelecer vínculos de aceitação, confiança e consideração.
Um pouco maiorzinhos, vamos aprendendo que a modulação, o volume e o timbre da voz dos adultos revelam muito sobre suas intenções, as quais – por sua vez -, são constituídas em concordância com caráter emocional daqueles que nos cercam. Crianças que se desenvolvem em companhia de adultos excessivamente silenciosos e pouco interativos, podem vir a sofrer de distúrbios comportamentais, sociais e de linguagem, em virtude da pobreza de repertório advinda da pouca interação.
Por outro lado, bebês criados em ambientes excessivamente ruidosos, em famílias que tem por hábito usar vozes alteradas para se comunicar e entre pessoas com comportamentos prioritariamente ríspidos, tendem a desenvolver personalidades irritadiças e podem vir a ser crianças difíceis de lidar, uma vez que a sua memória afetivo-social conta com recursos pouco desenvolvidos do ponto de vista da linguagem afetiva.
Nenhuma criança, a menos que seja portadora de distúrbios psíquicos – e este diagnóstico só pode ser feito por profissionais da área da Psiquiatria ou Psicologia -, revela comportamentos agressivos sem que haja uma causa, um disparador para tais comportamentos. A agressividade pode ser fruto de um trauma emocional que, tanto pode ser absolutamente real, quanto nascido de uma fantasia da criança acerca da situação em que tenha se sentido ameaçada ou ferida. O comportamento agressivo pode ter origem no convívio com pessoas agressivas, pouco afetivas, exageradamente severas ou exigentes.
Já no convívio com os pares – e em geral essa experiência ocorre na escola -, a criança desenvolverá a forma de se relacionar com os demais, a partir dos modelos que essa instituição validar, oferecer ou orientar. Educadores precisam saber mediar conflitos, precisam estar preparados para administrar e conduzir as relações dentro do universo escolar, de forma que todos os envolvidos tenham espaço garantido para expressar o que sentem, pensam e esperam desse convívio.
Escolas que baseiam suas práticas na valorização excessiva de resultados, que estimulam a competição e que não defendem a necessidade de espaços democráticos de convivência, transformam-se em verdadeiras panelas de pressão. As crianças submetidas a modelos pedagógicos pouco reflexivos, sentem-se excluídas do processo e se transformam em presas fáceis de comportamentos instintivamente rebeldes e reativos.
Que o exemplo é infinitamente mais poderoso que o mais elaborado dos discursos, todos nós já sabemos. O curioso é observar que, mesmo diante dessa constatação óbvia, ainda sejam surpreendentemente comuns famílias pouco envolvidas na formação de seus filhos, e escolas pouco aptas para ofertar espaços de convivência onde seja possível formar gente que, além de pensar, seja também capaz de refletir e considerar o outro como parte de suas prioridades.
Que o mundo anda cada vez mais hostil, que tem sido cada vez mais difícil ter em quem confiar e que temos sido insistentemente confrontados com a nossa falta de jeito para compartilhar o que pensamos, sentimos e desejamos, também parece bastante óbvio. Talvez, então, o que nos falte é sair desse lugar na arquibancada, arregaçar as mangas e as convicções e entrar de vez no protagonismo do jogo.
Nossos pequenos são extremamente vulneráveis diante de nossas escolhas e formas de organizar o mundo. Cada um de nossos olhares, gestos e falas é, em síntese, um ensinamento sobre o que é ser humano nesse mundo. Sendo assim, não custa nada darmos uma boa esfregada em nosso falso verniz social para trazermos à tona uma versão mais real e humana de nós mesmos. Sejamos nós o exemplo de retidão, honestidade, generosidade e afeição que tanto sonhamos para o futuro de nossos filhos!