Para mim não dá. Eu passo. Não quero e não aceito a celebrização industrial da vida. Para ser “alguém”, ninguém precisa ser famoso. Cá entre nós, um mundo onde há mais celebridades do que motivos para celebrar é um lugar doente.
Nada contra o sujeito renomado, o cantor de sucesso, a ilustre modelo e atriz. Mas aqui em casa nenhum deles é mais célebre que o meu pão com ovo de gema mole.
Vão me perdoar os editores das revistas de fofoca, mas celebridade para mim é qualidade do que é célebre. Célebre é o que se deve celebrar. E celebrar, entre outros significados, é acolher com festa.
Pode parecer nada, mas eu tenho mais motivos para festejar meu pão com ovo em casa do que para aplaudir um casal televisivo furando a fila de um restaurante, passando à frente dos anônimos que ali esperam para pagar por uma refeição só porque trabalha na novela.
Olhe ao redor. Já viu quantas celebridades instantâneas estourando aqui, ali e em todo canto? Saúde a todas elas! Mas eu acho mesmo é que nos falta bons motivos para celebrar. Aliás, falta a cada um de nós reconhecer o quanto há de celebridades em nossas casas e o quanto não as reconhecemos como tal.
Fosse o mundo mais justo, nosso banho depois do trabalho seria a estrela das celebridades. Você chega em casa, o corpo cansado da lida, a cabeça pedindo remanso, e ele está lá. À espera. Pronto para levar pelo ralo toda a sujeira do dia. O banho depois do trabalho não aparece na televisão, não sai em coluna social, não figura na lista de best seller. Mas é um grande e verdadeiro motivo de celebração.
Os amigos da gente. Poucos ou muitos, os amigos que a gente faz na vida são célebres figuras essenciais à nossa sobrevivência. Celebridades importantíssimas. Nossos parceiros e nossos amores, nossos pais e professores, nossos filhos e netos, sobrinhos e agregados. Nossos bichos! Nosso pijama velho, o sofá da sala que nos abraça, o porteiro boa gente. A panela que foi presente de pessoa querida, o travesseiro que tem o nosso cheiro. Nossas coisas. Nossos companheiros pela vida. Esses, sim, merecem toda sorte de festejos. São celebridades reais, indispensáveis e, quase sempre, despercebidas.
Nossa gente, aquela que nos entra no coração sem mais, rica ou pobre, branca ou preta, popular ou desconhecida, é sempre figura ilustre. Sempre motivo de celebração. Porque o desejo de celebrar, essa disposição poderosa por encontrar razões para agradecer e festejar, ahh… isso independe de fama, dinheiro, sucesso. É para quem tem o coração amoroso e a alma generosa.
Mas vá lá. Para provar a você e a mim mesmo que não sofro de antipatia por quem aparece na televisão, confesso: eu também celebro aquela gente que não se acha especial por ser famosa e insiste em carregar as próprias malas. Aquelas aves raras que dividem com os outros o que têm e o que são. Aqueles poucos seres capazes de ver o trabalho que os coloca sob os holofotes exatamente como o que é: só mais um trabalho.
Essa gente, por sua atenção em resgatar os valores que se perderam por aí, merece ser motivo de celebração. Tanto quanto a minha casa, meu banho quente e o meu pão com ovo de gema mole.
Imagem de capa: Unchalee Khun/shutterstock
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