Ana Macarini

Por uma vida com mais motivos para achar graça e perder o fôlego

A rotina em excesso pode configurar uma droga lícita com altos poderes viciantes e até letais. Tudo em nome de uma tal de “excelência”. Mas que porcaria é essa, afinal?
Vivemos sendo assediados por “métodos para melhorar a performance”; “coaching para turbinar a vida financeira”; “bônus para bater as metas no final do mês”; “treino de crossfit para derreter todas as gorduras do corpo”; sem falar naqueles “métodos infalíveis para ser popular, desejável e exercer seu magnetismo pessoal”.

Ufa! Não há quem aguente um bombardeio desses, sem sair com alguns pedaços – físicos, mentais, e espirituais – perdidos por aí, enquanto se tenta infrutiferamente ganhar o prêmio de: o maior, o mais rápido, o mais bem-sucedido, o mais forte, o mais bonito, o mais foda.

Tem, por exemplo, o caso daquele cara que se matou de trabalhar para ter uma casa chique com piscina naquele bairro super classe alta da cidade, onde o metro quadrado é mais caro que uma viagem à praia (ah, sim essa comparação procede). Acontece que o cara comprou a tal casa. Mora lá há dez anos, e nunca, NUNCA deu um único mergulho na maldita piscina. Por quê? Porque não tem tempo nem de se coçar, imagine de nadar.

Se o cara obcecado pela casa com piscina tivesse dado a si mesmo o direito a alguns fins de semana na praia, numa pousadinha despretensiosa mesmo, muito provavelmente não teria conseguido adquirir a citada propriedade, mas também, muito provavelmente, seria mais feliz.

Sim, é claro que algum tipo de rotina é indispensável, ou inevitável. A maior parte de nós, responde pelo próprio sustento. Alguns de nós, responde, além do próprio, pelo sustento de outros. E, é bem verdade, que quase tudo nessa vida custa dinheiro. E também é bem verdade que dinheiro ainda não dá em árvore. Logo, temos hora para acordar, horas a trabalhar, temos que comer, dormir, tomar banho, atender necessidades físicas inadiáveis. Só aí, já se vai quase o nosso dia inteiro, percebe?

Portanto, seria no mínimo algo a se considerar, trabalhar em algo que nos trouxesse alguma coisa além de apenas dinheiro; que a gente pudesse acordar tendo o prazer de um “bom dia” amoroso e gentil; que a gente tivesse a delicadeza de levar à boca algo que seja mais do que alguma “gororoba pronta e processada”; que ao dormir, tivéssemos a leveza psíquica necessária para sonhar e deixar vir à tona, nossas inúmeras vontades reprimidas; que o banho fosse um momento de lavar o corpo e o peso invisível das cobranças e obrigações; e que as nossas necessidades físicas fossem atendidas, porque tem gente que – PASME! –, segura o cocô e o xixi, porque não teve tempo de ir ao banheiro! Como assim?!

Mas, de verdade, tudo isso pode ser revisto, revisitado e transformado. Se no meio de toda essa pressão, a gente achar um jeito de viver, apenas viver. Isso já é alguma coisa. E viver, passa por permitir-se aquelas coisas lindas que fazem a gente achar graça em estar vivo.

Sim! Rir ainda é um dos remédios mais milagrosos deste mundo. E além de um sorriso no rosto, quem sabe a gente não arranje coragem para uma extravagância, algo que nos tire o fôlego… tipo um beijo dado na curva da orelha, sem nenhuma pressa, sabe?

Ahhhh… você sabe! Você sabe. E eu também sei. Que a vida que a gente leva, é a vida que a gente acredita merecer. E, sim haverá momentos difíceis. E crises. E alguma doença que nos tire o sono. Não há como evitar as dificuldades e as más surpresas. Mas, é nosso dever e direito, cuidar para que nossa vida não se resuma a isso. Viver é maior! É mais bonito, quando esperamos da vida o presente que mais secretamente desejamos, e acreditamos que somos merecedores de recebê-lo!

Ana Macarini

"Ana Macarini é Psicopedagoga e Mestre em Disfunções de Leitura e Escrita. Acredita que todas as palavras têm vida e, exatamente por isso, possuem a capacidade mágica de serem ressignificadas a partir dos olhos de quem as lê!"

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