Quando os olhos se apaixonam, ficam mais unidos, procuram o mesmo alvo. Querem ver quem os fez sentirem mais vida. Passam a comandar o resto do corpo. Ordenam que as pernas se apressem, porque logo a observada chegará.
Se ela não vem, invocam a imaginação e fazem a cabeça ignorar o presente, enxergando apenas a imagem imponente da saudade.
Se ela chega, tornam-se brilhantes atores. Sobem no palco, cantam, dançam, formam o mais misterioso espetáculo da Terra. Digo misterioso, porque, por vezes, ninguém notará que os olhos estão tentando deixá-la bem.
Ao contrário das mãos, quando os olhos se apaixonam, ficam alegres sem precisar tocar a observada. Sabem eles de suas limitações. Jamais poderão abraçá-la, beijá-la, porém, orgulham-se de serem os únicos capazes de percebê-la.
Por isso, o corpo inteiro fica esperando a opinião dos olhos. Eles são quem dizem se ela corresponde, a partir de dados extremamente relevantes. Como a curvinha da testa, o ajeitar do cabelo e, talvez o mais instigante, o olhar dela.
Porque cada olho, lá no fundo, apaixona-se mesmo é por outro olho. Busca em outras retinas a inspiração de suas visões profundas.
Temos coisas demais para observar, dois olhos são insuficientes. Na faculdade, em casa, no trabalho, nós nos relacionamos com inúmeros globos oculares.
Tudo para não deixarmos a vista cansar, descansamos em vários outros olhares.
E, entre tantos, surge um que irá nos atrair. Nele está algo que queremos conhecer e talvez nem saibamos o que seja. Os olhos, esses danados, apaixonam-se e não nos explicam nada.
Sem entender muito, fugimos. Fazendo-os se irritarem, a ponto de chorarem ou recusarem-se a abrir. Fecham-se em protesto.
Mas, ah… Quando eles são correspondidos. Ficam abestados. Viram duas criancinhas contentes.
Sorriem mais bonito que os dentes.
Não reclame, caso os seus donos se juntem, a ponto de parecer que quatro olhos viraram um. Pois é assim, meu bem.
Quando os olhos se apaixonam, tomam conta da gente.