Por Tatiana Nicz
Existe uma fábula antiga* que me marcou muito. Ela conta a história de dois amantes que não tinham nenhuma riqueza aparente e acabam descobrindo de maneira inusitada que seu amor era suficiente para eles. Essa fábula trouxe pela primeira vez uma reflexão sobre algo que nunca me ensinaram: o que exatamente seria “suficiente”?
Acho que ninguém define o que é suficiente, porque suficiente é demasiadamente relativo. O que basta para mim não é a mesma quantidade do que basta para você, sendo assim, apesar da definição existir no dicionário ela me parece um tanto quanto utópica no contexto de sociedade. Mas apesar de utópica no contexto plural, ela se faz fundamental para evolução espiritual de qualquer indivíduo. Buda chegou a fazer essa reflexão, na verdade ela é um dos pilares mais importantes do budismo onde (no meu entendimento) “suficiente” pode ser chamado de “o caminho do meio”. Sabiamente e não por acaso que não encontramos nas escrituras budistas uma definição do que seria esse caminho na prática, portanto o convite é que cada pessoa trabalhe para encontrar o seu próprio caminho do meio.
É difícil falar de suficiente para uma geração que conhece muito bem a abundância, sabemos que abundância é algo crucial para que a roda do capitalismo gire, em um mundo onde necessidades são criadas, onde quantidade é melhor que qualidade, não é interessante para o sistema que aprendamos sobre “suficiente”, então o que nos ensinam desde muito cedo é sobre a importância de acumular. Portanto acumulamos. Acumulamos amigos e amores. Acumulamos diplomas. Acumulamos dores. Acumulamos bens.
Nessa busca incessante e seguindo “à risca” o que nos é ensinado, queremos sempre mais: comemos mais do que precisamos, temos mais roupas do que necessitamos, compramos mais coisas do que precisamos, moramos em lugares maiores, gastamos mais do que precisamos e consequentemente precisamos de mais dinheiro para dar impulso à esse ciclo sem fim. Nada parece nos bastar.
E se para a matéria é um pouco mais fácil entender o conceito de suficiente (talvez uma muda de roupa seja suficiente para vencer o dia, um carro seja suficiente para me transportar, etc), o mesmo não vale para as emoções. O que acontece é que na era da abundância a sociedade te exige mais, sua família te exige mais, você se exige mais. Muito mais. Seja mais feliz, mais magro, mais rico, obtenha mais sucesso, seja mais bondoso, mais paciente, tenha mais amigos, seja sempre mais. Nada, absolutamente nada, nos convida ou incentiva a bastar. Se contentar é quase sinônimo de fracassar.
E ao abordar suficiente é ainda fundamental que tomemos um momento para olhar para o “copo menos cheio”, porque suficiente significa equilíbrio e no equilíbrio igualmente não há espaço para a escassez. Na lista de 72 nomes de Deus da Kabbalah encontramos no número 50 “IUD NUN DALED” (ou YOD NUN DALET), que com sabedoria aborda o conceito de suficiente e nos convida a meditar sobre o que nos é dado de menos: “Desperto a persistência e a paixão para nunca – nunca mesmo – contentar-me com menos!”.
É paradoxal que apesar de vivermos em uma aparente era de abundância, vivenciamos cada vez mais um período de muita falta. E assim nos acostumamos a viver com menos. Menos amor. Menos cumplicidade. Menos tolerância. Menos olho no olho. Menos honestidade. E como menos realmente não deve bastar à ninguém, mais uma vez nos ensinam a buscar mais. Então desde que contei a tal fábula pela primeira vez, e talvez muito antes disso, venho refletindo sobre meus limites:
Quanto me é suficiente?
Quanto amor é suficiente? Quanto do que dou é suficiente? Quanto do que recebo é? Quanta luta basta? Quanta alegria é suficiente? Quanta dor me basta? Qual a linha entre a persistência e o desapego? Quanto de ambição me basta? Qual é o tanto que me preenche? Qual é a gota d´agua? Quanto de informação é suficiente?
Se como já disse anteriormente “suficiente” é algo muito pessoal, seria tolice então dar respostas prontas para essas perguntas. O que posso fazer é falar de algumas descobertas apenas: que a linha do suficiente além de pessoal é ajustável; que nós vivemos adaptando-a de acordo com nossos interesses e dos outros; que geralmente nos esforçamos mais do que devíamos nesse processo, talvez na esperança de que um dia o que temos realmente nos baste ou talvez buscando reconhecimento; que ninguém nos ensina sobre a beleza do bastar; que somos imprudentes e vivemos ultrapassando o limite do que seria saudável para nós e para os outros; que frequentemente nos esquecemos de respeitar e até celebrar nossas limitações e com isso sofremos.
Então se assim como eu, também não lhe ensinaram sobre a importância desse conceito, faço aqui um convite à reflexão: quanto lhe é suficiente?
E o meu palpite é que no momento que passarmos a olhar com mais cuidado e atenção para nossas limitações e aprendermos a respeitá-las, nos liberaremos de muita carga e culpa e então descobriremos que é provável que “suficiente” more em quantidades muito maiores ou menores do que aquelas que nos foram ensinadas.
***
* A Fábula do que era suficiente
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