É preciso muita coragem para admitir que se está com medo. É preciso muita bravura para reconhecer que estamos assustados e passar desse ponto, ao ponto de respirar fundo e voltar à tona, depois dos inúmeros caldos que vivemos a levar das ondas da vida.
Quem já se sentiu ameaçado sabe que, muitas vezes, acabamos por agir de formas absolutamente inesperadas. Reagimos. E reagir significa apresentar uma alteração física, psíquica ou comportamental diante de um estímulo.
Reagir é mais próximo dos nossos instintos animais do que da nossa capacidade de pensar. A mais equilibrada das pessoas pode revelar-se furiosa diante de uma afronta; assim como, a mais reativa das pessoas pode perder a voz e até os movimentos diante de uma agressão sofrida.
Depende. Tudo depende, da nossa disposição, situação ou disponibilidade de recursos naquele momento.
Não somos seres definidos, como as abelhas ou as formigas que, independente das intempéries ou dos infortúnios, seguem obstinadas no cumprimento de suas missões.
Acima das abelhas, há a colmeia; acima das formigas, há o formigueiro. Essas nossas companheiras de jornada no planeta são seres coletivos. Nós, não. O individualismo nos rege e delineia nossa personalidade.
Vez em quando, ousamos sair da casca e olhar em volta sem que haja nenhum interesse próprio envolvido. Mas isso é raro. Muito raro.
O que nos falta em generosidade, amor gratuito e empatia, nos sobra em facilidade para dar notas de zero a dez às formas como cada um encontra de lidar com suas mazelas.
A dor do outro, essa incompreendida, é um absoluto mistério para nós. Ficamos abismados com as aparentes coragens alheias, porque simplesmente nos falta entendimento, ou disposição para entender que o medo é um atributo tão universal, quanto democrático.
Num mundo rico em desigualdades, se há algo que nos assemelha é o nosso despreparo para lidar com as coisas que dão errado, com as negações, as frustrações, os não-perdões. No entanto, a inconteste verdade é que, diante do perigo somos todos humanos.
Quem nunca teve medo não sabe o que é ter coragem. Porque tem horas que a vida é caverna escura mesmo. Não tem lanterna, nem vela, nem vagalume.
Tem horas que falta luz em nós, por dentro e por fora. Seja porque cometemos enganos, falhamos demais com aqueles que mais confiavam na gente ou porque fomos irremediavelmente enganados, magoados ou feridos.
Mas, assim como tudo, a escuridão não dura eternamente. A dor é tão efêmera quanto a mais inebriante das alegrias. E quem for desarmado o suficiente para fazer do medo um aliado de trajeto, há de descobrir nas curvas mais fechadas do caminho a sua própria força.
E quem, sabe, com um pouco mais de esforço, encontrar um jeito de compreender e aceitar que o outro, por mais ideal, forte e corajoso que pareça, também tem o direito de fraquejar.