Viver em paz tornou-se o meu mais ambicioso projeto de vida. Sonho com uma espécie de bloqueio auditivo, visual e sinestésico de proteção a tudo e todos que ainda permaneçam acreditando que sou um ser perturbável, vulnerável e atingível. Às vezes, eu consigo essa blindagem… às vezes…
Há rachaduras pelas quais acabam vazando uns murmúrios insistentes, uns olhares de julgamento, umas energias de perturbação e desequilíbrio que ainda me atingem e roubam de mim a tão sonhada paz.
Mas sonho que se preza começa mesmo assim… meio etéreo e difuso. É só aos poucos que as imagens sonhadas vão se transformando em silhuetas mais nítidas; as silhuetas viram croquis caprichados; os croquis vão ganhando vida e a vida vai ganhando cores extras, à medida em que o sonho sonhado se mistura à realidade vivida.
E já é uma grande coisa descobrir de fato que a gente não faz esse papel horroroso dos outros que vivem para desmontar sonhos alheios. É uma alegria imensa perceber que a gente não faz parte dessa “seleta espécie humana” que vive com seus dedinhos indicadores apontados para as falhas alheias, as faltas alheias, os ganhos alheios, as dores… tudo que o outro ganhou ou perdeu, só pelo gostinho nefasto de agir como se a vida alheia fosse uma trama televisiva, passível de ser analisada, avaliada, julgada e condenada.
O ruído externo é enorme. O ruído externo pode roubar o seu sossego, a sua vontade de ir à luta, o brilho dos seus olhos e a sua voz.
O truque é cultivar uma música interna que se sobreponha à barulheira de fora. Uma música, cuja letra e melodia te façam ter vontade de dançar despido e livre dessas armaduras que o mundo foi acomodando em suas costas, sem ter a delicadeza de tirar suas medidas. Armaduras frouxas, apertadas, descabidas que podem transformá-lo num boneco de lata.
Então… se for para abrir os olhos, que seja para olhar o mundo por novos prismas… por um foco novo e inusitado, a partir do qual todas as novas leituras venham mais ricas em significados e lições de revirar a alma.
Se for para abrir as cercas à nossa volta, que seja para acolher em nossos espaços apenas aqueles que vierem para somar esforços, numa busca por dias de sol manso e brisa de mar. Que venham apenas aqueles que saibam abraçar de verdade, conversar com os olhos e ouvir com o coração.
E se for para dar ouvidos, que sejam recebidas, traduzidas e entendidas apenas as palavras capazes de se transmutar em tijolos de evolução. Palavras com o poder de construir pontes. Muros, não.
Porque palavras destrutivas são como ervas daninhas. Tomam tudo, sem convite. Destroem o que se plantou com tanto sacrifício. Palavras destrutivas podem ruir você por dentro e por fora, caso você conceda sua permissão.
E críticas… críticas são sentenças decretadas por qualquer um que tenha acabado de tomar o trem, mas tem a absoluta certeza de que possui o incontestável direito de se sentar na janelinha. Para estes… ofereça o seu mais sagrado silêncio. O silêncio é maravilhoso antídoto contra qualquer tipo de veneno. O silêncio é uma prece poderosa… porque deixa o outro que tentou te roubar a paz ouvindo suas próprias inúteis palavras ecoando num eterno “repeat” em seus próprios ouvidos.
Imagem de capa meramente ilustrativa: cena do filme “Simplesmente Acontece”.
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