Categories: Sem categoria

Receita para dias tristes e irritantes

Sigo uma regra: se começar a dar tudo errado, volto. Volto para casa e deixo tudo para depois. Não importa se era importante, o dia seguinte também será, então eu paro, apenas paro, porque sei que se não conseguir mudar a frequência tudo continuará meio torto. A receita é simples: parar também faz parte do caminhar, lembrando que para cada clima há uma vestimenta.

Se o incômodo for tristeza, lave louças, arrume a casa, mas jamais as gavetas; tristeza e gavetas não combinam, pois a quietude de uma se choca ao agito das calcinhas e camisas em ebulição gerando a preguiça. Preguiça é tristeza sem vocação.

Se a querela existencial for mau humor desligue telefones, arrume gavetas e leia um livro. Nunca, jamais, procure resolver qualquer pendência afetiva, aliás essa regra vale para todas os estados emocionais que não sejam de absoluta tranquilidade. Melhor fazer um bolo.

Se o peito apertar, banho longo, chocolates e filmes bobos; cozinhar é absolutamente proibido, peça algo no delivery mais próximo. Se der pânico, não preste atenção no corpo, porque se a mente está confusa o corpo se comunica em língua estrangeira, geralmente em língua morta.

Para todas as condições, reze. Rezar é antes de tudo silenciar. Reze para Deus, Nossa senhora, um santo, um amigo, uma árvore, Buda ou seu avô, não importa, silencie os cômodos e incômodos de seu corpo.

Foi a partir destas receitas que me ensinei uma grande lição: cuidar de cada dor separadamente. É preciso cuidar de cada dor separadamente de modo a embalá-la com cuidado. Verificar cada infiltração, cada amasso. Reconhecer suas desordens, insistências e excessos, e apenas após tamanho cuidado, deixá-la ir.

Sentimentos devem ser embalados em acalantos particulares, não se deve olhar as dores como quem soluciona equações nem tampouco apenas organizar os sentimentos em gavetas adequadas; cada dor deve ser observada, silenciosamente, sem grandes alardes. Tudo o que está em seu quintal de algum modo é seu, e sendo assim a resposta também será sua, ainda que surja lentamente.

É preciso cuidar de cada dor separadamente, de modo a embalá-la com cuidado. Verificar cada infiltração, cada amasso. Reconhecer suas desordens, insistências e excessos, e após tamanho cuidado, deixá-la ir, mas não sem antes guardar sua lição, e a maior lição que as dores nos deixam é a de que um dia fatalmente as deixaremos ir.

Imagem de capa: Dudarev Mikhail/shutterstock

Luciana Chardelli

Luciana Chardelli é carioca, jornalista, escritora e advogada pós graduação em Direito Penal e Processual Penal. É autora do livro "Penso, logo insisto. Um desencontro." Escreve também na Revista Obvious.

Recent Posts

Por que casais falam com voz de bebê?

Se você já presenciou um casal adulto conversando em tons infantis, com vozes suaves e…

1 hora ago

Nova série de suspense da Netflix tem 6 episódios viciantes e um desfecho surpreendente

Você não vai querer sair da frente da TV após dar o play nesta nova…

12 horas ago

Somente 3% das pessoas é capaz de encontrar o número 257 na imagem em 10 segundos

Será que você consegue identificar o número 257 em uma sequência aparentemente interminável de dígitos…

13 horas ago

Com Julia Roberts, o filme mais charmoso da Netflix redefine o que é amar

Se você é fã de comédias românticas que fogem do óbvio, “O Casamento do Meu…

1 dia ago

O comovente documentário da Netflix que te fará enxergar os jogos de videogame de outra forma

Uma história impactante e profundamente emocionante que tem feito muitas pessoas reavaliarem os prórios conceitos.

1 dia ago

Nova comédia romântica natalina da Netflix conquista o público e chega ao TOP 1

Um filme charmoso e devertido para te fazer relaxar no sofá e esquecer dos problemas.

1 dia ago