Buscando enganar a sua realidade mediante a própria fantasia, o homem moderno procura a projeção da imagem sem o apoio da consciência. Evita a reflexão  esclarecedora, que pode desalgemar dos problemas, e permanece em contínuas tentativas de negar­se, mascarando a sua individualidade. O ego exerce predominância no seu comportamento e estereotipa fantasias que projeta no espelho  da imaginação.

Irrealizado, porque fugindo do enfrentamento com o seu eu, transfere­se de aspirações e cuidados a cada novidade que depara pelo caminho. Não dispõe de decisão para desmascarar o ego, por temer  petrificar­se de horror, qual se aquele fosse uma nova Medusa, que Perseu, e apenas ele, venceu, somente porque a fez contemplar­se no escudo espelhado que lhe dera Atena.

Obviamente, esse espelho representa a consciência lúcida, que descobre e separa objetivamente o que é real daquilo que apenas parece. Nesse sentido, o ego  que vive e reincide nos conteúdos inconscientes, necessita de conscientizar­se, desidentificando­se dos seus resíduos emergentes. O homem vive na área das percepções concretas e, ao mesmo tempo, das abstratas.

A cultura da arte faz que ele se porte, ora como observador, ora como  observado e ainda o observador que se observa, a fim de poder transformar  os complexos ou conflitos inconscientes em conhecimentos que possa conduzir, senhor  da sua realidade, dos seus atos.

Sua meta é poder sair da agitação, na qual se desgoverna, para observar­se, a distância, evitando o sofrimento macerador.

A este ato chamaremos a separação necessária entre o sujeito e o objeto, através da qual se observam os acontecimentos sem os sofrer de forma dilacerante, modificando o estado de ânimo angustiante para uma simples expressão do  conhecimento, mediante a transferência da realidade que jaz no  espírito para o  exterior das formas e da emoção.

A reflexão constitui um admirável instrumento para o logro, apoiando­se na cultura e na realização artística, social, solidária, que desvela os mananciais desentimento e de consciência humanos. Jogado em um mundo exterior agressivo, no qual predominam a luta pela sobrevivência do corpo e a manutenção do status, o homem acumula conteúdos psíquicos não descartáveis nem digeríveis, avançando, apressado, para o stress, as neuroses, as alienações.

Acumula coisas e valores que não pode usar e teme perder, ampliando o  campo do querer, mais pelo receio de possuir de forma insuficiente, sem dar­se conta da necessidade de viver bem consigo mesmo, com a família e os amigos, participando das maravilhosas concessões da vida que lhe estão ao alcance.

Comedir­se, agir com sensatez e tranqüilidade, confiar nos próprios valores e nas possibilidades latentes são regras que vão ficando esquecidas, a prejuízo da harmonia pessoal dos indivíduos.

Os interesses competitivos postos em jogo, a aflição por vencer os outros, o  sobrepor­se às demais pessoas desarticularam as propostas da vitória do homem sobre si mesmo, da sua realização interior, da sua harmonia diante dos problemas que enfrenta. As linhas do comportamento alteradas, induzindo ao exterior, devem agora ser revisadas, sugerindo a conduta para o conhecimento dos valores reais, a redescoberta do sentido ético da existência, a busca da sua imortalidade.

Quando o homem moderno passar a considerar a própria imortalidade em face da experiência fugaz do soma, empreenderá a viagem plenificadora de trabalhar  pelos projetos duradouros em detrimento das ilusões temporárias, observando o  futuro e vivendo­o desde já, empenhado no programa da sua conscientização  espiritual. Nele se insculpirá , então, o modelo da realização em um ser integral, destituído do medo da vida e da morte, da sombra e da luz, do transitório  e do  permanente, da aparência e da realidade.

De Joanna de Angelis, escrito por Divaldo Franco

No livro “O homem integral”

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