Respeito romântico, por Fabrício Carpinejar

Eu amo tanto minha mulher que temo dizer que estou feliz quando estou sem ela. Até porque não sou inteiro mesmo. Não considero justo. Não condiz com à realidade.

No momento em que ficamos distantes, por viagem ou motivos profissionais, não esnobo, não me gabo, não exagero a felicidade. A saudade não deixa.

Respondi que o passeio foi dentro das expectativas, o restaurante foi gostoso, a noite com os amigos foi agradável. Nada demais. Não faço propaganda da minha eventual saída, não existe nostalgia da autonomia de solteiro, muito menos a necessidade de gerar ciúme e criar comparações. A discrição é demonstrar cuidado com o nosso par.

Não omito, realmente não me sinto confortável em ser melhor quando ela não está junto. E não sou. Sou um quase bem simpático.

É uma questão de respeito romântico. Elogiar excessivamente o desapego equivale a subestimar sua presença tão marcante ou subentender que ela não é necessária.

É uma questão de respeito romântico. Elogiar excessivamente o desapego equivale a subestimar sua presença tão marcante ou subentender que ela não é necessária.

Não me envergonho da dependência, posso ser classificado como alguém sem liberdade e submisso. Alguém sem vida própria. Não acho que é isso. Talvez seja antiquado, herdei valores familiares e uma etiqueta de relação que não abdico. Privacidade corresponde a proteger quem amamos de nosso orgulho e soberba. Escolhi viver com ela e, apesar de afastado por alguns dias, continuo vivendo com ela. Longe ou perto, não mudo em nada da minha mentalidade casada.

Qual a graça de contar vantagem? Nenhuma. É mais uma implicância do que uma verdade.

Há sempre uma ponta de melancolia em minhas andanças sozinho, uma brisa fria a sussurrar em meus ouvidos o quanto ela gostaria daquele espaço.

Eu me torno um olheiro sentimental de nosso casamento, conheço paisagens e locais só para depois mostrar para ela. Minha função é recrutar alegria para nós – e descobrir o que provocará seu arrebatamento. Transformo a visita solitária em convite a dois: “Passei por um lugar que vai adorar, pensei na gente”.

E o mais bonito é que ela faz o mesmo, sem jamais combinarmos a troca de gentilezas.

Fabrício Carpinejar

Publicado originalmente na Revista IstoÉ Gente

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