Autor desconhecido.
Adaptação Nara Rúbia Ribeiro.
Certo dia, senti-me totalmente derrotado e vencido. Nada fazia sentido: o mundo, a vida, meu trabalho, nada. Decidi que pularia de uma ponte situada no outro lado da cidade. Escrevi uma carta aos meus familiares e caminhei em direção à ponte.
No caminho, necessitei atravessar um bosque. Avistei, ali, uma pequena fonte d’água e parei para contemplar a que seria, talvez, a última beleza a ser vista em minha existência. Junto à fonte, num banco já desgastado pelo tempo, um indigente me olhava com muita atenção.
Estava a poucos passos de mim e fez um gesto para que me aproximasse dele. – O que se passa com você, meu jovem? – ele perguntou com um ar sereno, embora preocupado. – Decidi terminar com tudo hoje. Nada, para mim, funciona. Sou o homem errado para esse enredo de vida que alguém me escreveu.
Sua resposta me surpreendeu: “Olhe em redor. Você está vendo a samambaia e o bambu?”
“Sim, estou vendo”, respondi.
“Pois bem, a Vida se encarregou de semear, a um só tempo, as samambaias e o bambu. A ambos não faltaram água, luz, seiva… A samambaia cresceu rapidamente. Seu verde brilhante cobria o solo. Porém, da semente do bambu nada saía.
Apesar disso, a Vida não desistiu do bambu. No segundo ano, a samambaia cresceu ainda mais brilhante e viçosa. E, novamente, da semente do bambu, nada apareceu. Mas, a Vida não desistiu do bambu.
No terceiro ano, no quarto, a mesma coisa. Mas, no quinto ano, um pequeno broto saiu da terra. Aparentemente, em comparação com a samambaia, era muito pequeno, até insignificante.
Seis meses depois, o bambu cresceu mais de 5 metros de altura.
Ele ficara cinco anos afundando raízes. Aquelas raízes o tornaram forte e lhe deram o necessário para sobreviver.
Essa dor que você sente e aparenta ser sem propósito, ao longo de todos esses anos, é, na verdade, o rasgo de suas raízes. Elas estão se tornando mais profundas aí dentro.
A Vida não desiste nunca. Não é correto comparar-se a outros. Sua trajetória é única. Seria justo desistir da Vida? Desistir justamente de quem provê aquilo de que você mais necessita para contemplar, em breve, a existência de um lugar mais perto do céu?
Baixei a cabeça e, com olhos marejados, procurei alguma palavra para dizer àquele desconhecido maltrapilho. Quando levantei o rosto, percebi que não precisava dizer mais nada. O indigente não estava mais ali e, sinceramente, nem posso precisar se aquele homem um dia existiu.
Escritora, advogada e professora universitária.
Administradora da página oficial do escritor moçambicano Mia Couto.
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