Hoje eu senti saudade dela. Deve ser esse frio, essa chuva. Gente antiga tem umas coisas. Quando vira o tempo as cicatrizes coçam, o coração aperta. Agorinha mesmo ela estava aqui. Minha casa ainda respira a sua presença e minha pele já sente a sua falta.
Vivemos no mesmo tempo, habitamos a mesma cidade, passamos pelas mesmas ruas, estamos próximos no mapa e no resto. Somos almas vizinhas. E eu tenho tanta saudade dela quanto do instante mais bonito da infância. Eu acho que sei por quê. É que eu volto a esse lugar e a esse tempo quando ela está perto de mim.
Volto para minha casa quando estou com ela. É ela o meu lugar preferido no mundo. E quando ela se vai, eu penso em quando vou encontrá-la a próxima vez. Em quando estarei em casa de novo.
É por isso que eu tenho saudade. Sinto a falta dela como quem não visita os próprios pais há muito tempo, como quem sonha rever amigos distantes, reencontrar os avós que se foram, voltar no tempo e viver de novo a formatura da oitava série do ginásio. Tudo isso um instante depois de encontrá-la um segundo ou uma tarde inteira. Não importa. Eu tenho saudade dela.
Então espero, espero o tempo que for. Espero caminhando, seguindo em frente. Uma hora eu chego até onde ela estiver e fico ao seu lado para sempre.
Desse dia em diante, a falta que eu sinto agora, esse buraco no peito, essa ferida invisível, essa premência física, como se uma glândula abusada produzisse em meu corpo um desejo urgente de estar junto ao dela, tudo isso há de ser quase uma lembrança triste, quase um sentimento estranho. Quase uma outra saudade.
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