Pamela Camocardi

Se a inveja tem sono leve, que tome sonífero. Suas comemorações só começaram…

Imagem de capa: Air Images/shutterstock

A inveja incomoda porque nunca vem de alguém distante. Essa é a verdade. Ninguém inveja a fortuna de Salomão, o sucesso dos grandes empresários ou o corpo da musa fitness do momento.

Inveja-se a amiga que emagreceu, o vizinho que virou empresário ou o ex que ficou rico. A inveja é essencialmente comparativa. Sêneca dizia que “ a inveja avista apenas o que está próximo de si, e admiramos com menos astúcia o que está distante.”

Inveja é um sentimento obscuro, visto que ninguém quer admitir que inveja ou é invejado. A primeira opção, porque isso significa admitir incompetência diante das conquistas dos objetivos da vida, a segunda porque dá a impressão de estar ostentando o que se conquistou.

Melanie Klein, psicanalista austríaca, explica que “a inveja é o sentimento raivoso de que outra pessoa possui e desfruta algo desejável – sendo o impulso invejoso o de tirar este algo ou de estragá-lo (…), e o ser invejoso sofre ao ver o outro possuir o que ela quer para si. Sente-se à vontade apenas com o infortúnio dos outros e assim, todos os esforços para satisfazer um invejoso são infrutíferos”.

Na Literatura temos muitos exemplos clássicos de como a inveja manipula o caráter humano, através da raiva e do sentimento de insatisfação. Otelo, o mouro de Veneza, de William Shakespeare, onde a inveja secreta e o ódio que Iago alimenta por Otelo é o grande elemento desencadeador da tragédia do mouro, que culmina matando Desdêmona, a mulher que ama e Caim, de José Saramago, que narra a história do anti-herói Caim – personagem bíblico – que, após matara seu irmão Abel por ciúmes e inveja, sai pelo mundo para protagonizar uma briga antológica com Deus, são alguns dos exemplos.

Talvez a sociedade tenha um pouco de culpa nisso. Desde muito cedo sofremos comparações: “aquela é mais bonita”, “esse é mais inteligente”, “aquele é mais doce”. Essas críticas, muitas vezes, “inocentes” e “sutis” deixam marcas de competitividade no subconsciente e criam adultos dispostos a tudo para conseguirem o que querem.

Nessa linha de ações e, com medo dos invejosos de plantão, a sociedade inventou, também, um tal de “não grite sua felicidade que a inveja tem sono leve” que tem feito gente guerreira engolir a própria felicidade com medo de perder a própria vida. Ridículo, não? Mas, acredite, é real. Miguel de Cervantes tinha uma definição interessante sobre o sentimento “a inveja vê sempre tudo com lentes de aumento que transformam pequenas coisas em grandiosas, anões em gigantes, indícios em certezas.”

O conselho são sempre esses: Viajou? Não comente! Vai casar? Não fale para ninguém! Encontrou o amor da sua vida? Pede para o líder religioso benzer! Mas ninguém explica o motivo dessas atitudes.
Sejamos realistas: seus sonhos não vieram prontos em caixinhas de papelão. Você lutou por cada um deles. Suas vitórias custaram momentos difíceis, noites de dúvidas, intermináveis dias de espera e, agora, você não pode comemorar para não despertar a inveja do outro? Isso é, no mínimo, incoerente.

Em que se baseia esse medo que paralisa pessoas guerreiras diante da própria felicidade e os fazem acreditar que “felicidade em silêncio dura mais”? Se a inveja tem sono leve, que tome sonífero. Ela não te ajudou a conquistar nada e não vai te atrapalhar a progredir mais, a não ser que você permita. A tática da inveja é paralisar pelo medo e você, que até hoje, enfrentou um leão por dia, vai deixar se amedrontar por lagartixas?

Ser discreto é bonito, fino, educado. Mas, que isso seja uma opção de comportamento sua, não por medo da inveja alheia.

Olhe para dentro de você, para sua história. Quando você caiu, ninguém invejou sua queda. Você precisou tirar forças da alma para se levantar. Quando você foi ferido, ninguém invejou sua dor. Pelo contrário, você precisou se curar sozinho, mesmo sangrando. Note: nos piores momentos da sua vida, nenhum sentimento negativo teve poder sobre você, então, o que te faz acreditar que depois de todo o sofrimento vencido, você voltaria à estaca zero por capricho de quem não conseguiu chegar ao topo?

Não tema a inveja alheia, as lutas na vida foram iguais para ambos, mesmo que pareça que não. A diferença é que os invejosos se acomodaram diante das adversidade e preferiram ficar na plateia admirando quem atingiu os objetivos almejados.

Quer saber? Siga a sua vida sem medo e comemore suas vitórias quando quiser. Se o outro continuar te oferecendo o mal, lembre-se que veneno servido só faz mal para quem o engole.

Pamela Camocardi

A literatura vista por vários ângulos e apresentada de forma bem diferente.

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