Erick Morais

Se você ficar sozinho, pega a solidão e dança

Em tempos de rede, tornou-se extremamente difícil ficar sozinho. Digo mais, estar sozinho revestiu-se de um significado muito negativo, como se a solidão trouxesse à tona algo ruim que queremos esconder e/ou não lembrar. Entretanto, se ficar sozinho produz um incômodo perene em nosso ser, o problema não está na solidão, e sim, em nós.

As relações humanas são fundamentais para que possamos nos desenvolver individualmente e coletivamente, ou como diz Exupéry, é o maior luxo que podemos ter. Contudo, para que consigamos usufruir plenamente de qualquer relação, é preciso que sejamos inteiros, o que significa dizer, que precisamos nos conhecer, estar em harmonia com as nossas entranhas, ter na solidão uma parceira de dança.

Essa solidão que promove a máxima socrática do “conhece-te a ti mesmo” é também chamada de solitude, e difere da solidão patológica (a que afasta o ser do mundo) por promover o encontro com o nosso eu despido de qualquer máscara, subterfúgio ou proteção que usamos na vida social. Encarar a si mesmo em meio a tantas pessoas nem sempre é uma tarefa fácil, até por isso, a solitude torna-se fundamental no processo de introspecção, autoanálise e descobertas que fazemos.

Ter um tempo só para nós, em que possamos investigar as nossas longitudes, vasculhar os nossos pensamentos, lavar os nossos avessos, é imprescindível para que a nossa casa esteja minimamente arrumada. Nesse processo, encaramos monstros que insistimos em não confrontar, refletimos sobre o modo como estamos levando a vida e o que queremos dela, como temos nos portado nos nossos relacionamentos, conseguimos olhar de modo mais maduro e crítico para os nossos fracassos ao passo que direcionamos as coordenadas para novos sonhos, além de descobrir coisas maravilhosas acerca do nosso eu que sequer imaginávamos.

Ou seja, a solitude consegue nos levar a um grau muito maior de autoconhecimento e, consequentemente, de felicidade, já que quando se é um forasteiro de si próprio é impossível ser feliz. Da mesma forma, ela permite aumentar as cores dos nossos olhos, iluminar a nossa alma e, assim, enxergar mais belezas no mundo que nos cerca.

No entanto, encarar-se sem nenhum tipo de “proteção” é uma experiência que a maior parte de nós procura desesperadamente escapar. Isso se dá porque temos medo, como disse, de encontrar algo que nos desagrade ou nos faça sofrer. Mas, ao buscar o prazer inevitavelmente esbarramos na dor. Portanto, se quisermos descobrir o que somos, o que queremos e, desse modo, razões muito mais fortes para viver e ser feliz, não há como também não sofrer e enfrentar os nossos monstros.

Encarar a nossa “natureza selvagem” não é fácil, mas permanecer sendo um completo estranho de si também não traz nenhum benefício, já que, se ao estarmos sozinhos sentimo-nos sempre incomodados e tristes, é porque de tanto não nos “encontrarmos”, acabamos nos tornando terra seca para que as nossas próprias belezas consigam florescer. É apenas quando nos sentimos em harmonia com a nossa solidão, que conseguimos romper a solidão do outro e nos conectar, pois, como diz o poeta: “Enquanto não atravessarmos a dor de nossa própria solidão, continuaremos a nos buscar em outras metades. Para viver a dois, antes, é necessário ser um”.

Nota: O título do texto faz parte da letra da música “Três Dias” (autoria de André Dahmer e Marcelo Camelo).

Imagem de capa: Anmar/shutterstock

Erick Morais

"Um menestrel caminhando pelas ruas solitárias da vida." Contato: erickwmorais@hotmail.com

Share
Published by
Erick Morais
Tags: solidão

Recent Posts

O filmaço romântico que está tocando o coração de milhões com sua trama apaixonante

Se você está à procura de um filmaço que mistura romance, humor e uma pitada…

10 horas ago

O filme intenso e saboroso da Netflix que vai te fazer ficar em casa esta noite

Se você estava procurando um bom motivo para não sair de casa hoje, saiba que…

16 horas ago

Professora causa confusão ao sugerir que estudante com dois pais é adotado

O estudante é fruto de um arranjo familiar em que a mãe biológica é irmã…

18 horas ago

Esta comédia romântica estrelada por Kate Hudson é uma das apostas certeiras na Netflix

Se você é fã de comédias românticas, provavelmente já ouviu falar de "Como Perder um…

1 dia ago

Série sedutora e envolvente da Netflix com apenas 6 episódios vai te fazer perder o ar

É impossível resistir aos seis deliciosos episódios desta série que está disponível na Netflix.

2 dias ago

Filme absurdamente lindo da Netflix tem só 14 minutos e faz as pessoas se desfazerem em lágrimas

Poucas pessoas conseguem passar pelos 14 minutos arrebatadores deste filme sem derramar uma única lágrima.

2 dias ago