Será mesmo que o amor sumiu das grandes cidades?

Sim, existe amor em SP! E em Paris, Piracicaba, Minas Gerais, Madri, Cruz das Almas. O amor não deu no pé. O que eclipsa sua presença são as expectativas, as convenções sociais, a necessidade de uma bússola ou de uma tábua de salvação.

O amor pode sobreviver ao mau humor matinal, à depilação por fazer, ao futebol de domingo, às cutucadas suspeitas no Facebook. Mas nenhum amor sobrevive ao peso da obrigação de ter que dar sentido à vida de alguém.

Porém o destino é um menino travesso que teima em nos enviar um par justamente quando estamos ao avesso.

Como ser par sem antes ter conseguido ser ímpar? Ignoramos esta pergunta. Quem precisa ser ímpar quando se pode ser par?

Afinal o amor dá jeito nas coisas, não dá? Não foi isso o que nos ensinaram? Que o amor supera tudo?! E se o amor supera tudo, claro que vai nos desvirar do avesso, nos botar no prumo e nos fazer sentir conforto em nossa própria pele. É questão de tempo.

O tempo! Ah, o tempo! Pobre rapaz… O tempo se zanga com a troça do destino e, para provar que nada tem a ver com isso, corta o mal pela raiz: provoca a ruptura.

Daí por diante começa o desatino: lágrimas, injúrias, fúria, raiva, melancolia, sentimento de menos valia, solidão.

De quem foi a culpa, afinal? Alguém precisa levar a culpa!

Sobra para quem? Para o amor. É tudo culpa do amor! Esse monstro que por puro egoísmo fugiu das grandes cidades e deixou as metades das laranjas partidas desencontradas e perdidas.

Coitado do amor! Ele tem implorado por atenção, mas ninguém o ouve. Quem consegue ouvir os apelos do amor estando anestesiado de medo? Amor, que amor? Estamos mais ocupados em saber se é por aqui que se vai para lá. Estamos mais preocupados em saber se seremos aceitos, bem sucedidos e bonitos na foto do que qualquer outra coisa.

Não conseguimos nos amar, nos aceitar, nos admirar, nos respeitar. Como é que conseguiremos amar, aceitar, admirar e respeitar o outro?

Se acaso precisamos que um amor ratifique que somos bons, capazes, especiais e únicos, ele simplesmente morre. O amor não tolera esse tipo de exigência. O amor não tolera expectativas desleais.

Nada nem ninguém, nem mesmo o amor, o sentimento mais poderoso e cobiçado da face da terra, poderá nos oferecer identidade, segurança e conforto. E nosso desconforto anda tão grande, tão imenso, que para não olharmos para os nossos abismos dizemos que “não existe amor em SP” ou em parte alguma. Pior, dizemos que os amores se tornaram líquidos – como se algum dia ele tivesse sido outra coisa que não fluidez.

Bobagem! Nós é que precisamos nos desfazer de certas bagagens inúteis e de um bocado de coragem para convidar um velho amigo para uma xícara de chá: o amor-próprio.

O amor não fugiu das grandes cidades. Ele não foi a lugar algum. Ele continua onde sempre esteve.  É que ele só visita quem convida seu irmão gêmeo para uma xícara de chá.

FALANDO NISSO

Escrevi o texto acima após assistir ao filme Amores Urbanos, de Vera Egito. O filme narra as desventuras amorosas e conflitos existências de três amigos de trinta e poucos anos na cidade de São Paulo. Vale a pena conferir.







Mônica Montone é formada em Psicologia pela PUC-RJ e escritora. Autora dos livros Mulher de minutos, Sexo, champanhe e tchau e A louca do castelo.