Conversávamos quando o som de notificação de seu celular nos interrompeu, e eu senti Alice estremecer. Era a sincronicidade trazendo a má notícia… Um inesperado desfecho para aquela mesma história que ela me contava. Após um longo silêncio, vi uma lágrima cair encontrando as palavras que brilhavam na tela.
A história triste de Alice era sobre seu envolvimento com uma colega do trabalho. O fato da colega ter um namorado de longa data, não impediu que as duas ficassem um dia em uma festa… E mais outra vez algumas semanas depois. Finalmente, no terceiro encontro, a colega foi clara e disse que não tinha nenhuma intenção de terminar seu relacionamento e propôs a Alice que continuassem se encontrando… “Quando eu puder”, disse ela. Apesar da ênfase na condição apresentada, Alice estava tão distraída pela ideia romantizada daquela mulher que desejava que nem se atentou para as implicações da proposta. (Até porque Alice é daquelas que cresceu ouvindo que homem não presta… Mas mulher, não, mulher é diferente…). E, assim, durante alguns meses, se fez refém nessa história onde seu querer nada ditava, e só se via a esperar. Refém de um desejo que já não sabia se era dela ou da outra. Refém nessa situação onde todas as saídas levavam a frustração. Até que, enfim, como aquele que atira no animal ferido agonizante, a colega com meia dúzia de palavras colocou um ponto final no caso; e sem direito a recurso! Pois o “não” ali quem falava era o desejo soberano, aquele que sempre esteve em questão, e o que sempre foi o eixo da relação.
Alice é uma personagem… Alice é real… Alice é toda aquela ou aquele que um dia teve sua identidade subjugada pelo desejo perverso de um outro que de tão cego em seu caminho para a satisfação não vê que naquela mesma reta segue um querer que não é o dele. Alice é aquela que procuramos quando estamos entediados, a escolha conveniente de quem prefere se sentir mal acompanhado a se sentir sozinho. Alice é aquela que liga demais, que se importa demais… E que, às vezes, evitamos. Alice é aquela que dispensamos tão logo aparece a “pessoa certa”. Alice é o alvo do abuso de que todos somos culpados, fomos ou seremos um dia.
Mas Alice também somos nós. Os que investem em relacionamentos fracassados, os que insistem em oferecer o seu amor a quem diz “Não, obrigado”, os que só conseguem se ver através do olhar indiferente do outro e encontram nesse reflexo nada além da menos valia. Os que andam pela vida procurando o amor, mas que dão menos valor a mensagem respondida do que a não lida. Os que esperam conquistar afeição demonstrando não se importar.
Alice somos todos nós, vítimas e algozes de nós mesmos… Alice são todos que padecem na tragédia do desencontro.
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