Imagem: Jacob Lund/shutterstock
Vivemos na era da informação. Vivemos na era da comunicação. Na era das redes, dos fios, dos cabos, da interconectividade. Estamos todos ligados, plugados, conectados.
Todos juntos, como se o mundo tivesse se transformado em uma bola de gude. Vivemos na era da globalização. Criamos uma nova linguagem e, assim, estabelecemos uma nova maneira de nos comunicar, de nos relacionar.
Modificamos a própria estrutura social, já que como diz Clay Shirky, escritor estadunidense: “Quando mudamos a maneira como nos comunicamos, mudamos a sociedade”. Mas, o que de fato conseguimos melhorar com tudo isso? A nova comunicação realmente nos aproximou ou apenas nos transformou em solitários interconectados, como define Bauman?
Não tenho dúvida de que a linguagem é fundamental para o desenvolvimento humano, tanto individual, quanto coletivo. É por meio dela que conseguimos estabelecer um elo comunicativo e, por conseguinte, nos aproximar uns dos outros. Entretanto, é recorrente na história o uso da linguagem para oprimir, afastar, iniciar conflitos, dominar (como é recorrente nas histórias de Orwell), cercear direitos (neste caso, sendo pela falta de linguagem oferecida aos detentores desses direitos, como acontece em Vidas Secas de Graciliano Ramos). Ou seja, a linguagem ao longo dos tempos tem sido utilizada muito mais como uma barreira do que como uma ponte, função primordial e insuperável dela.
Apesar disso, com as transformações que ocorreram nos últimos anos nessa área, via de regra, essa relação conturbada com a linguagem deveria ser modificada. Entretanto, o que temos percebido tanto no mundo on-line quando nos desdobramentos do mundo off-line é o aumento da incapacidade comunicativa dos seres humanos.
Não é preciso falar dos benefícios, ao menos em potencial, oferecidos pela rede mundial de computadores. Isso é elementar. Todavia, facilitar a comunicação, tornando-a possível em tempo real por pessoas de extremos diferentes do globo, não significa necessariamente uma maior conectividade entre as pessoas.
Uma real conectividade, a qual não precisa necessariamente acontecer no mundo off-line, não é estabelecida a partir de uma troca de palavras sem sentido mais profundo e íntimo em uma rede social. Ela necessita de tempo e de uma troca de palavras que contenham sentidos amplos e profundos sobre quem as profere. Mas, sejamos sinceros, não é bem isso que acontece de maneira ampla na rede. Isso pode ser explicado, segundo Bauman ao citar o sociólogo Manuel Castells, porque:
“Na nossa sociedade, os protocolos de comunicação não são baseados em compartilhamento de cultura, mas na cultura do compartilhamento. ”
Em outras palavras, ao construirmos a cultura do ciberespaço, a estruturamos em um modelo que se baseia em uma série de interações sem fio de pessoas distantes, que – embora em uma “comunicação” – continuam incomunicáveis, haja vista o não compartilhamento da sua cultura, do seu eu pessoal, da sua carga sígnica intima e verdadeira.
Isso se reverbera em um estado de aparências frágil, inclusive, de comunicação e aproximação entre as pessoas. As cidades, cada vez mais superlotadas, explodem em construções cada vez maiores, que tapam a natureza, assim como existe um número cada vez maior de cabos, que cobrem o céu e ligam máquinas, mas não necessariamente, homens. No meio disso, se encontram as pessoas em seus pequenos espaços. Plugadas, ligadas, conectadas, e ao mesmo tempo tristes, angustiadas e sozinhas.
Assim sendo, a ideia de Shirky está correta. Mudamos a comunicação, mudamos a sociedade. Mas, ao contrário do que se esperava, tornamo-nos ainda mais estranhos do que antes. Isso ocorra, porque acreditamos que a complexidade das relações humanas pode ser simplificada por cliques em um mouse. Mas esquecemos, que ainda que isso seja possível, é necessário ser mais do que silenciosos, imóveis e frios.
Embora a era digital possua, como disse, no mínimo um potencial a ser explorado pela comunicação; o que ocorre é que ela tem servido muito mais para nos manter afastados, cada um em seu lugar (físico e emocional) ao mesmo tempo em que se desfruta da sensação falsa de que há uma conexão estabelecida, a qual nos tornou mais próximos.
E, assim, cria-se a ideia de que podemos receber muito dando quase nada, porque tudo está a um clique, o que vale para o mundo on-line e off-line, que hoje para alguns, são dois lados de uma mesma moeda. E tomando como base essa ideia, há de se considerar, então, que talvez em uma nova transformação o que deve ocorrer para que haja modificações verdadeiras na nossa condição de “solitários interconectados”, seja mudar as variáveis de lugar, mudando primeiro a sociedade, para que em seguida realmente haja uma mudança na comunicação.
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