“Estou desempregada, de novo e há muito tempo, demasiado tempo.
Nunca pensei chegar a este ponto, mas não sei mais o que fazer. Parece que a vida se zangou comigo e agora faz tudo para me roubar a alegria e a esperança, que por mais que a tente segurar, me vai escapando a cada não que ouço.
Depois que o Pedro me deixou sozinha com o Tomás, sinto um mundo inteiro em cima de mim, e é pesado, muito pesado. Deixei de ser mulher para tentar ser a melhor mãe, mas sinto fracassar todos os dias.
O Tomás tem oito anos e não tem culpa dos erros dos pais. O Tomás tem oito anos e não tem culpa de ter nascido neste país. O Tomás tem oito anos e tem o direito de ser feliz. O Tomás é o meu filho e é o filho que sempre quis. Tem apenas oito anos e não sabe ele que é a força de viver de uma mulher que luta todos os dias para lhe dar uma vida melhor, que é a motivação de uma mãe para se levantar a cada rasteira que a vida lhe prega. Não sabe ele que tem sido a minha esperança e a minha luz, na noite que são os meus dias.
Abençoada ingenuidade que me tem ajudado a protegê-lo.
Tive de o tirar do futebol, não tinha como pagar a mensalidade. Deixei de poder vê-lo sorrir enquanto me acenava para a bancada depois de um golo. Deixei de ouvir os seus relatos entusiasmados das jogadas que fazia, quando regressava dos treinos. Deixei de ver a pequena camisola dez a secar no estendal e os sonhos que aquele pedaço de pano carregava. Todas estas pequenas coisas cortam-me o coração pela falta que eu sei que lhe fazem e pelo sentimento de culpa e incapacidade que me cravam na alma.
Não aguentei as lágrimas quando me perguntou: porquê, mãe? E eu não consegui responder-lhe.
Chorei só, e ele abraçou-me. Naquele momento era como se tivéssemos invertido os papéis de mãe e filho.
Nunca mais me voltou a perguntar porquê, e ficou calmo.
Sinto que no fundo ele sabia exatamente o que se passava, e aceitava-o… melhor que eu. Ele é que é o meu herói.
Mas o futebol foi apenas a primeira de muitas coisas, até que um dia o Tomás foi ao frigorífico e não havia mais os iogurtes que ele tanto gostava. E no armário, os únicos cereais que havia eram os mais baratos, e até o sumo… passou a ser apenas água com limão.
Preparava-lhe todos os dias o melhor pequeno-almoço que conseguia, colocava-lhe tudo pronto na mesa e encostava-me ao balcão a olhá-lo, só.
De vez em quando perguntava-me porque não me sentava com ele a comer, e eu dizia-lhe apenas que não tinha fome… mas não era isso. Numa dessas vezes fez uma pausa nos cereais, foi à gaveta dos talheres, entregou-me uma colher e perguntou: dividimos? Sentámo-nos os dois em silêncio, naquela manhã, enquanto não chegava a hora de ele ir para a escola, e eu só me apercebi que estava a chorar quando uma lágrima me caiu sobre a mão.
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Nota da CONTI outra: Agradecemos ao autor por autorizar a reprodução do texto “Sou mãe e pai” neste site.
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