“Tinha tanto medo da solidão que nem afastava as moscas.”
Mia Couto
Vivemos uma crise de criatividade humana. A sociedade moderna em que vivemos é uma grande marqueteira de urgências desnecessárias. Ela nos ensina que não precisamos criar, em nós, os nossos próprios valores e nos entrega os modelos de uma vida feliz desenhada por estrategistas de mercado que são, em regra, aferidos em cifrões.
Assim, sem nem mesmo pensar, nossa existência passa a ter sentido, sempre, na aquisição de dinheiro para fazer frente a necessidades inventivas.
Vejamos: o celular adquirido há poucos meses como de “última geração”, já não nos serve; surgiu um outro que dizem ser em algo “melhor” que o atual e sem que nem mesmo saibamos explicar qual a melhora, ansiamos pelo novo. O veículo em perfeito estado de conservação necessita ser trocado, posto que todos os amigos trocaram seus veículos nos últimos anos e você não trocou. E necessitamos de um escritório novo, de uma roupa nova apesar do armário abarrotado. E precisamos da cirurgia que corrige a ruga, do status que o outro tem, do holofote, do aplauso… Queremos ser conduzidos no carro do triunfo do agora até o pódio de “celebridade”.
O problema é que nos esquecemos de um pequeno detalhe: nenhuma dessas glórias pode saciar, em nós, a sede incessante de amor. Como buscá-lo, se só sabemos da lógica da compra e da venda e estamos destreinados a conquistar, doar ou a receber afetos? Há tanto nos esquecemos de que o outro pode e deve ser mais que um adversário na luta cotidiana; que o outro não é mero apoio ou escada para nossas conquistas materiais. E quanto mais nos aproximamos do carro do triunfo é que melhor percebemos, em nosso íntimo, o quão solitários nos tornamos.
O fantasma da solidão nos apavora, levando-nos a paixões doentias. Habituados a possuir, queremos a chave da alma de outrem. Queremos fazê-la propriedade nossa: namorado, esposa, filhos, amigos. Mas é vedado ao homem possuir uma alma segunda: a alma que possui, deve bastar-se a si. E o que fazer, então, se a nossa alma se encontra esvaziada de nós mesmos?
Quando damos fé desse abismo que cavamos ao nosso derredor, resta-nos regressar à infância e resgatar a criatividade que a vida há tanto nos oferta. Ver que aquilo que temos de material (carros, aparelhos, imóveis) é brinquedo, muitas vezes até descartável, que o Universo nos entrega para que possamos brincar de existir. E é tão triste brincar sozinho! Cultivemos amizades, espalhemos gentilezas! Que ouçamos o outro, que não desmereçamos a sua importância como parte de nossas vidas.
Que transborde em cada um de nós a competência de criar nosso próprio mundo de valores e nortes, ideais e até utopias, de modo que sejamos integralmente aptos e responsáveis na condução dos próprios destinos. Artistas a redesenhar este mundo, a partir dos rascunhos de seus próprios corações.
Nara Rúbia Ribeiro, Goiânia, 14-11-14.
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