Fabíola Simões

Tem horas que a gente tem que matar o passado dentro da gente

Hoje pela manhã, me deparei com um post no Instagram que dizia: “Alguns assuntos já foram assuntos demais para serem assuntos novamente”. E me senti acolhida pelas palavras, pois tenho um coração nostálgico, que de vez em quando me trai e traz de volta assuntos que já se encerraram dentro de mim. Porém, de uma vez por todas, hoje quero me despedir e esquecer.

O tempo dos acertos, das saudades, de reconciliações com minha história, de me lembrar do passado com doçura e algum apego passou, e deu lugar a um desejo enorme de que a vida seja contada com cheiros do presente e sabor de surpresas, desfrutando com sabedoria o tempo que se descortina à minha frente.

Tem horas que a gente tem que matar o passado dentro da gente. Sacrificar de uma vez aquela lembrança “preciosa” que não nos permite crescer. Fechar a porta daquele lugar distante no tempo que não nos ajuda a prosseguir. Dar um basta às velhas desculpas que justificavam nossa saudade, nossa nostalgia, nosso “resgate” e finalmente entender que desapego é uma das lições mais difíceis, porém mais necessárias, que iremos ter na vida.

Temos que ser fortes e corajosos para romper com aquilo que julgávamos “nossa vida” e não é mais. Valentes para desvincularmos nosso caminho da armadilha do saudosismo, da repetição de velhos hábitos, da crença de que ainda há o que se buscar no tempo que já se esgotou.

Porém, nunca estaremos imunes a sermos traídos pela emoção. Como eu gosto de afirmar, somos a soma do que amamos e do que vivemos, e de vez em quando aquilo que amamos terá disposição para vir à tona. Não se culpe quando isso acontecer. Porém, após a visita da saudade, coloque-a de volta no seu lugar. O passado tem a função de nos lembrar como chegamos até aqui, mas não pode, de maneira alguma, nos definir.

O passado tem mania de seduzir. Olhando pelas lentes da nostalgia, tudo fica mais bonito do que realmente foi. Glamorizamos nossas experiências e enfeitamos nossas trivialidades de um jeito que não nos permitimos fazer com o presente. Editamos nossas lembranças e ventilamos nossas dificuldades a ponto de acreditarmos que sempre fomos mais felizes naquele lugar que não existe mais.

Por mais difícil que seja, existirão momentos em que teremos que nos despedir de algumas histórias que foram importantes para nós. Nem tudo nos cabe, e viver carregando no peito nossas vidas não vividas não nos permite crescer.

Está na hora de encerrar essa história dentro de você. De esquecer pessoas que já te esqueceram faz tempo. De manter “contato zero” com aquilo que traz de volta o que não existe mais. De deixar morrer a expectativa vã, a esperança inútil, a teimosia dolorosa. De finalmente perceber que matar alguns fatos do passado não nos torna pessoas cruéis; ao contrário, nos reconecta com aquilo que realmente importa.

Imagem de capa: Ollyy/Shutterstock

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Fabíola Simões

Escritora mineira de hábitos simples, é colecionadora de diários, álbuns de fotografia e cartas escritas à mão. Tem memória seletiva, adora dedicatórias em livros, curte marchinhas de carnaval antigas e lamenta não ter tido chance de ir a um show de Renato Russo. Casada há dezessete anos e mãe de um menino que está crescendo rápido demais, Fabíola gosta de café sem açúcar, doce de leite com queijo e livros com frases que merecem ser sublinhadas. “Anos incríveis” está entre suas séries preferidas, e acredita que mais vale uma toalha de mesa repleta de manchas após uma noite feliz do que guardanapos imaculadamente alvejados guardados no fundo de uma gaveta.

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