Não há dúvidas de que somos expostos, ao longo da vida, a inúmeras situações sobre as quais temos pouco ou nenhum controle; ter filhos não é uma delas, de jeito nenhum. A despeito do que preconizam filosofias espiritualistas sobre termos o poder de escolher quem serão nossos pais e familiares, na prática, inauguramos nossa história no mundo por meio da união entre duas pessoas que resolveram ampliar o número da espécie humana sobre a superfície do planeta. Ainda que a nova vida venha por meio de uma inseminação artificial, ou de uma “produção independente” houve a intenção e o envolvimento de dois seres para dar origem a essa vida. E é isso!
Seguindo essa linha de raciocínio – que não pretende anular nenhuma outra – saímos do útero materno para um ambiente absolutamente desconhecido, barulhento e cheio de estímulos tão espetaculares quanto assustadores. Salvos pelo instinto de sobrevivência, sorvemos com avidez o seio materno, por meio do qual temos a belíssima oportunidade de saciar, não apenas a fome e sede orgânicas, mas também – e talvez principalmente – a necessidade de abrigo e conforto afetivos. É no contato direto com a mãe que conseguimos somar à nossa inata curiosidade humana, uma maravilhosa rede de proteção emocional que nos prove para tomar parte dessa arriscada experiência que é viver.
Tudo estaria perfeitamente resolvido, caso aqueles que vieram antes de nós, não vivessem tentando subverter a ordem natural das coisas. Há quem não entenda o quanto é vital para um ser humano recém-nascido ser alimentado ao seio de sua mãe; ter respeitadas suas dificuldades de adaptação ao mundo externo; ter acolhidas suas necessidades físicas, de desenvolvimento intelectual e emocional. Há quem opte por ter filhos a fim de cumprir um estranho ritual criado pela sociedade, de acordo com o qual, gerar uma vida é parte de uma espécie de lista de tarefas da qual temos de dar conta, sob a ameaça de parecermos pouco adequados ou malsucedidos.
A realidade é que em pleno século XXI, com inúmeras maneiras de evitar uma gravidez indesejada, ainda há crianças nascendo “sem querer”. Há vidas humanas sendo trazidas ao mundo sem que tenham sido planejadas, queridas e desejadas. Há inúmeras pessoas dando à luz bebês de carne, osso e tudo o mais, sonhando em levar para casa bonecos ou bonecas bonitinhos e perfeitinhos. Essas pessoas parecem ficar surpresas ao constatar que suas crias dependerão delas por um longo período de tempo. Parecem totalmente despreparados para noites insones, montanhas de fraldas sujas e uma maratona de cuidados que precisam ser incluídos em suas rotinas.
Ora, se é verdade que há experiências inevitáveis e intransferíveis nesta vida, ter filhos não é uma delas. Ter filhos é um compromisso que se firma com alguém que ainda não existe; é assumir a responsabilidade por uma vida para sempre; é entender o real significado da palavra renúncia; é estar disposto a conhecer na carne e na alma o real significado de amor incondicional.
Esse bebezinho encantador embrulhado em roupinhas cheirosas e coloridas, não será um bebezinho para sempre. Ele vai passar por inúmeros desafios, por experiências maravilhosas e descobertas de tirar o fôlego; vai sentir medo; vai ter um milhão de perguntas para fazer; vai achar que já tem todas as respostas; vai se machucar; vai errar muitas e muitas vezes; vai precisar de uma mistura equilibrada de afeto, atenção, interesse genuíno e autoridade; vai precisar de amor afetivo e amor material também; vai adoecer; vai necessitar de uma estrutura familiar que pode vir de uma única pessoa – essa não é a questão – desde que essa única pessoa tenha realmente escolhido a responsabilidade de trazer a esse mundo maluco uma nova vida.
Quem fez a escolha de ter filhos, precisa aprender a enxergar a dimensão da missão espiritual que abraçou! Educar é muito mais do que ensinar boas maneiras! É muito mais do que garantir uma boa formação acadêmica; festas de aniversário; presentes; roupinhas descoladas e quartos que mais parecem uma loja de brinquedos. Educar é estar preparado para o fato de que há crianças que já manifestam comportamentos distorcidos desde muito pequenos; e, se esse for o caso, elas precisarão ainda mais da presença inteira dos pais. E de nada adiantará transferir a responsabilidade, alegando que a culpa é da televisão; que foi influência das “más companhias”; que ele só pode ter aprendido isso na escola, pois em casa ele é um amor… Enfim, filhos dão trabalho, muito trabalho, isso é inquestionável! Mas, foram uma escolha! E uma vez feita essa escolha, é indispensável observar; prover; orientar; ser firme e amoroso! O resultado? É poder orgulhar-se de ter cumprido uma das mais difíceis missões que um ser humano pode abraçar nessa vida: ser responsável por fazer a espécie humana valer a pena!
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