Por Maria Cristina Ramos Britto
Hoje escrevo para as mulheres e também para os homens que as amam exatamente como elas são. Mulheres de todos os tipos, para todos os olhares, com cabelos lisos ou uma juba poderosa, narizes finos ou com muita personalidade, testa alta, bochechas alegres, magras no torso, coxas grossas, cintura fina, quadris generosos, baixas, longilíneas. Mas escrevo, principalmente, para aquelas insatisfeitas com seu peso, o formato de seu corpo ou qualquer detalhe anatômico, que sofrem por isso e, muitas vezes, tentam qualquer coisa para se encaixar em um padrão. Sendo o biotipo marca de nascença, pouco pode ser modificado, e os exemplos são vários, entre eles, a barriga negativa e a penúltima obsessão das jovens: o espaço entre as coxas (thigh gap), observado em modelos, possível apenas em quem tem determinada estrutura óssea, ou seja, não depende de exercícios físicos ou dieta, já vem no mesmo pacote da cor dos olhos ou da altura.
Levante a mão a mulher que nunca se preocupou com a aparência, não é essa a questão, ser vaidosa é bom sinal desde que não se torne ideia fixa. Muita coisa é passível de ser aperfeiçoada, há cada vez mais opções de produtos e tratamentos para o autocuidado e o bem-estar. O problema surge quando o espelho se torna o vilão e a imagem que ele devolve não é a mesma percebida por quem se olha. Quando algo sempre parece estar faltando, sobrando ou não parecendo adequado, suficiente ou belo. Incômodo esse muitas vezes incentivado por uma cultura que pretende impor modelos estéticos incompatíveis com as características da maioria dos corpos, definidos por uma herança genética.
A grande cobrança social em relação ao corpo ainda se relaciona à obesidade. A mulher que está acima do peso sabe como é difícil enfrentar essa condição. Vista de forma pouco lisonjeira ou mesmo abertamente criticada como única culpada por sua situação, como se para ela não houvesse motivo ou explicação, apenas uma vaga falta de força de vontade, a própria vítima do preconceito vive assombrada pela culpa por se ter permitido chegar a tal ponto. Critica-se, sofre, vai perdendo a autoestima enquanto os quilos se acumulam, numa relação perversa onde causa e consequência se misturam. A dor transforma a fome em vontade de comer, e a comida passa de subsistência a conforto e martírio, num ciclo vicioso que só faz piorar.
É preciso compreender que magreza não é sinônimo de beleza, nem gordura testemunho de saúde, como já se acreditou em outros tempos. Falta e excesso se encontram em problemas físicos e sofrimento emocional, baixa autoestima incluída. A felicidade não está marcada na balança nem será alcançada pela aprovação de uma sociedade míope para as diferentes belezas dos corpos. Quer emagrecer, modificar algo em si mesma, sem exagero ou falsas expectativas? Que seja por você mesma, para se sentir bem e confortável consigo, olhar-se com satisfação, sem procurar defeitos que existem apenas na esfera do ideal, do corpo que não lhe pertence. Que a mudança não seja uma decisão imposta, um constrangimento para se sentir aceita e amada. Ame-se e aceite-se primeiro, o resto virá naturalmente.
O título desse texto é uma referência explícita ao filme de Domingos de Oliveira, de 1967, e a foto que o ilustra é de Leila Diniz. Uma homenagem às mulheres, e a lembrança de uma época em que elas ainda eram donas de seus corpos e seus desejos.
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