Por Alexandre Bonilha
“Tudo vale a pena quando a alma não é pequena”, imortal jargão de Fernando Pessoa, popularizado.
Nosso autor, acredito, não se chatearia se eu me utilizasse do trecho para enquadrar a alma em algum tipo de métrica, pretendendo-se descobrir, por acidente, o seu tamanho.
Povos indígenas, antigas civilizações, não por isso, acreditavam que a alma se imortalizava, ressurecta, mesmo após o fim da vida terrena. Como se a alma fosse digna ou estivesse autorizada a alugar outro corpo depois da morte, por exemplo.
Contemporâneos, talvez incrédulos de medida certa, exteriorizam a curiosidade e a convicção de que a dúvida acerca da alma não seria uma rodovia para percorrer.
Sequer provamos que existe ou contrampomos sua existência. Afinal, alma existe? A resposta é o gesto de fé, restando apenas o símbolo e a metáfora que buscamos neste texto, de que a alma pode ser medida. Mas isso não passa de uma intenção lúdica e de um ode à cultura.
Não pela regua dos deuses nem pela balança médica, não pela experiência do professor nem pela técnica do jogador, mas pelo nível de cultura que uma pessoa traz. Pela bagagem, pelo nível de reflexão. Por todos os pedaços, por todos os laços e fatias de vida que lhe compõem é que tornam a vida mais doce, leve e suave. Nós somos uma colcha de retalhos do conhecimento que trazemos.
Os olhos filtram o material imóvel e inanimado, enquanto o cérebro interpreta e remete às mais próximas lembranças. O olfato contextualiza o tempo e o espaço, sintonizando o ser às memórias passadas. A audição capta o dederredor e partilha da cognição. Nada diferente com o paladar, quando o churrasqueiro passou do ponto na carne salgada.
O mundo exterior, os lugares que você frequenta e os fatos que acontecem em sua vida são interpretados pela peneira dos teus sentidos, sabatinados por sua história e correspondidos por quem você é. Na memória de Sartre, “não importa o que a vida faz de você, mas sim o que você faz daquilo que a vida fez de você”
O dia de ontem frutificou o teu dia de hoje, assim como a tua sensibilidade norteia sua alma. E essa sensibilidade é produto de todo livro que foi lido, todo filme que foi assistido e todos os conselhos recebidos ou repassados.
Neste raciocínio, a cultura cumpre um papel significativo junto ao entendimento humano e figura como imperativo para satisfazer o indivíduo em seu devido lugar, grato por tudo e a todos. Afinal, não é ser feliz que faz grato, mas sim ser grato que te faz feliz.
Ainda que diante de eventos negativos, a cultura estabelece uma ponte entre as informações e estende um tapete vermelho entre números e letras, formas e contornos, propiciando um olhar diferente ao que ocorre.
Tudo, exatamente tudo, sempre vale a pena – ou até a galinha inteira. É, Fernando Pessoa. Tudo vale a pena quando a alma não é pequena. E a alma só não é pequena quando o indivíduo é grande.
Alexandre Bonilha é advogado, poeta às vezes e filósofo – quase – sempre, aprecia o “CONTI outra” desde quando começou.