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Um amor “on the rocks”, por favor?

Tem horas que é preciso ser pragmático. Deixar as ilusões românticas de lado. Dar um basta na fé. Se refugiar na raiva. Sentir o fracasso correndo nas veias. Parar com a balela de dar a outra face. Esquecer o perdão em uma ilha deserta. Suar profusamente de tanta desilusão acumulada. Ser humano. Simplesmente.

É isso mesmo. Não se trata de um texto sobre desistir de um amor por perceber que ele ficaria melhor sem a nossa companhia. Desejar sua felicidade em outros braços. Ser quase um iluminado. E os iluminados sentem ódio. Pode ter certeza. Nem que seja ódio de quem odeia. O texto é sobre o ócio depressivo. Aquele que nasce da mais profunda tristeza após o término de um relacionamento. Deitar na cama e ouvir a mesma melodia repetidas vezes. Dá para imaginar cenário mais perverso?

Em tempos de amor líquido é quase indecente desejar um amor “on the rocks”. Precisamos mesmo criar novas expressões para justificar a falta de interesse no outro e quem sabe até pela humanidade em geral? Isso é a boa e velha depressão. Não é uma nova condição humana causada pela velocidade dos meios de comunicação atuais. Se fosse assim, muitas relações amorosas seriam automaticamente restabelecidas quando houvesse a interrupção dos serviços de transmissão de dados.

A verdade que não se quer admitir é que seu parceiro não perceberia sua existência mesmo que vocês fossem para uma ilha deserta sem acesso a equipamentos eletrônicos de espécie alguma. Ele se entreteria com as estrelas, a lua, os sapos coaxantes, a areia da praia e até mesmo os mosquitos. Você continuaria no último lugar da lista de prioridades, bem depois do velho fax.

Por essas e outras é que colocar uma inocente pedra de gelo não vai fazer muita diferença. Embora muitos ainda insistam em utilizar esse recurso. De um lado o líquido (representando a impermanência das relações humanas) e de outro o sólido (representando a nossa resistência). Sabemos que a fusão será inevitável, mas mesmo assim colocamos a pedra de gelo no copo com água. Ela nos dá a ilusão temporária de que há algo diferente na bebida. Para alguns fica bem melhor. Para outros perde o sabor. O resultado final é sempre o mesmo.

Então, o que fazer? DESISTIR! Sair pela porta da frente correndo e só parar quando estiver em território seguro. Quem nadou nas águas salgadas do mar morto sabe que é difícil submergir. Corre-se o risco de ficar eternamente na superfície. Melhor navegar para outros mares. De preferência bem distantes. Tirar a poeira de sua bússola interna e partir. Ser novamente um descobridor.

As fases de um amor podem ser tão vertiginosas como as dos estados físicos da água. As mudanças bruscas são inevitáveis. Não somos as mesmas pessoas de ontem. Estamos em constante transformação. Se fossemos adaptar a lição do poeta Vinicius de Moraes, seria algo assim: que não seja permanente, posto que é líquido. Mas que seja sólido enquanto dure.

Adriana Abraham

Advogada e escritora, com cursos nas áreas de yoga e meditação. Carioca, residindo atualmente em Brasília.

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