Por Josie Conti
Um giro secreto em nós
faz girar o universo
A cabeça desligada dos pés,
e os pés da cabeça. Nem se importam.
Só giram, e giram.
– Rumi
Lembro-me de, ainda bem pequena, ir para o meio da sala e começar a girar ininterruptamente. Sabia que giraria até cair e que, quando caísse, o mundo continuaria girando. Criança que era, brincava de testar limites, encantava-me com as diferentes reações que meu corpo sofria, instintivamente girava.
Quem não se lembra de transpassar os braços com uma amiga e formar entre si o infinito sabendo que o giro dependia da velocidade e das mãos que nunca poderiam ser soltas? Quem, ainda hoje, não se emociona ao ver a alegria de uma criança quando alguém a gira no ar?
Giro é magia de brinquedo e dono de parque de diversões sabe disso. Uma das experiências mais fantásticas da minha infância eu passei em um brinquedo assim: O chapéu mexicano. Lindo, colorido, musical. Levada pelo meu avô materno fui colocada em uma de suas cadeirinhas. Enquanto ele começa a girar as cadeiras se distanciam do eixo. Ritmo, cores, velocidade, o vento no rosto e o voo. Até hoje, nenhum voo superou aquele passeio. Naquele mesmo dia, tomei suco de caju na barraquinha. Memória realmente feliz ninguém tira da gente.
Parece que quase tudo de bom que temos na infância gira. Bambolê, roda gigante, roda de amigos, gira-gira. Até pião gira.
Socialmente, estar em círculo faz toda diferença. O círculo coloca as pessoas em igualdade, facilita a conversa, permite o olhar. Círculo é ambiente colaborativo.
Os povos antigos já conversavam em torno da fogueira. As danças folclóricas acontecem em círculos.
Criança é mesmo um bichinho inteligente, sem saber de nada disso, gira e dança. Dá as mãos e roda.
Bernhard Wosien – bailarino, pedagogo da dança, desenhista e pintor – dedicou muitos anos de sua vida a coletar danças étnicas. É o maior nome quando falamos hoje em danças circulares.
Danças celtas, indígenas, danças utilizadas em rituais de casamento, nascimento, pedindo por chuva ou agradecendo pela colheita. Dançar é expressão da natureza humana.
Dançar em roda também permite o ritmo, a frequência, a repetição necessária para uma meditação que acontece em movimento. Quem entende do tema afirma que a energia dos membros do grupo fica harmonizada conferindo função também terapêutica.
Nada disso, porém, teria sido escrito por mim se, após adulta, não tivesse entrado em contato com a beleza sagrada dos Dervixes Rodopiantes (Mevlevi) da Turquia. Com uma mão apontada para cima e outra para o chão, eles se tornam um fio condutor entre o céu e a terra. Giram para a esquerda e para direita com suas saias rodadas numa espécie de transe que, para eles, coloca-os mais perto de Alah. É simplesmente sublime.
Girar é fortalecer a conexão consigo, com quem amamos, com nossa cultura, com o sagrado.
Então, física ou simbolicamente, giremos. Giremos até nos sentirmos livres.
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