Minha filha está chegando nos 27 anos. Eu desejo que ela seja ainda mais feliz do que já é. Eu desejo que a asma dela não fique agressiva e a faça sofrer. Eu desejo a ela que as frustrações sejam toleráveis e os traumas não façam ninho. Desejo que ela trate o amor com carinho e a dor com respeito. Eu desejo que ela seja companheira e amiga da realidade da vida, com suas maravilhas e mazelas.
Minha filha nunca teve uma fantasia de princesa quando era criança. Na adolescência, comprou uma coroinha prateada e usou duas ou três vezes. Matou a vontade. Nunca mais quis a realeza por perto, preferiu a vida plebeia, ainda bem.
Eu fui mãe de uma criança que voltava da pracinha pronta para ser jogada na máquina de lavar. Não havia uma roupa sem a menor manchinha. Mas minha criança brincou, abraçou cães gatos, voltou para casa com um carrapato atrás da orelha e o caso foi resolvido sem nenhum susto nem drama.
A diferença entre o mundo encantado e a realidade é mínima, é ridícula. Basta que saibamos cortar sem piedade os exageros que separam nossos filhos do mundo onde eles respiram e vivem.
O lúdico é encantador, o faz-de-conta é mágico, mas, como nos livros e filmes, tem hora para começar e acabar. A realidade vive em nós, nos nossos filhos inocentes, na relação que eles terão com o mundo.
Minha filha fez cara feia muitas vezes por eu não permitir que o mundo de mentira sentasse à mesa e jantasse conosco. Não sei se perdi a mão, posso ter perdido algumas vezes, confesso, mas sempre tentando fazer o certo e o justo.
Nunca consegui concluir qual é o melhor método para se educar um filho, mas, quase 27 anos depois, olho para ela, depois para mim, e então para nós duas, e sinto que consegui dar a ela um presente genuíno que não se encontra em um prateleira ou site de compras. A realidade. E ela é suave quando constato o caminho por onde minha cria passa.
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