Sempre tento ler os livros publicados pelo escritor e filósofo italiano Umberto Eco. Confesso que leio alguns com mais e outros com menos interesse. Destes, há livros que nem mesmo concluo a leitura, mas é sempre bom ao menos tentar concluir.
Na semana passada, o escritor, crítico contumaz das novas tecnologias, ao receber o título de Doutor Honoris Causa em Comunicação e Cultura, em Turin (norte da Itália), tocou em um assunto que, ainda que seja ele um notório intelectual com profundidade temática em diversos assuntos, certamente tanto eu que aqui escrevo quanto você que me lê entende mais do que ele: as redes sociais.
Segundo Eco, a internet dá direito à palavra a uma “legião de imbecis” que antes falavam apenas “em um bar e depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade”. Afirma Eco que, “normalmente, eles [os imbecis] eram imediatamente calados, mas agora eles têm o mesmo direito à palavra de um Prêmio Nobel”. E arrematou: “O drama da internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade”.
Estou aqui para concordar com o Eco e para analisar a sua brilhante constatação. De fato o escritor tem razão. Como duvidar dele? Idiotas de toda a ordem povoam as redes sociais. Mas o que o Eco não percebeu e que venho aqui ponderar é que os idiotas sempre tiveram a palavra, mesmo antes do advento da informatização.
Antes dela, gozavam da palavra muitos idiotas catedráticos. Seres dotados de conhecimento acadêmico, mas que, sem qualquer senso de humanidade, desfilavam as pérolas do seu conhecimento como se fosse exclusivamente seu, esquecidos de que centenas de pessoas laboraram para que aquele conhecimento se consolidasse, ao longo da história.
Antes dela, já gozam da palavra idiotas militarizados que estabeleciam verdades intocáveis e regras intransponíveis, cerceando atos e pensamentos.
Antes, valiam-se da palavra idiotas que, do alto de seus títulos, zombavam dos pequeninos situados lá embaixo, na pirâmide social, e estes tinham que agonizar calados diante das mazelas do mundo.
Antes da internet, estes e outros imbecis reinavam sozinhos, perfilando sua “vã filosofia” pelas cátedras, nos livros, em textos pouco compreensíveis, em dizeres enigmáticos, em tiradas de sarcasmo contra a massa inculta.
É preciso que alguém console o nobre escritor Umberto Eco, pois está democratizado o status de imbecil. Os primeiros já não reinam sozinhos e absolutos. Agora até quem não tem um Nobel, pasmem, pode achar-se gente e fazer uso da vez e da voz.