Lembranças são vaga-lumes

Lembranças são vaga-lumes que acendem e apagam dentro de nós. Basta um fragmento de sonho, uma música, um perfume ou um determinado sabor, para que lembranças adormecidas acendam , transportando-nos àqueles momentos vividos.

Outras se apagam para sempre, levando à morte psíquica. Lembranças que partem sem dizer “Adeus”; memórias que morrem pelo entorpecimento costumeiro, ou pela falta de cuidado consigo mesmo, ou por não ter companheiros com quem atualizar seu passado por meio de narrativas. O fio vital trinca-se como consequência infeliz na trama da vida.

Como regressar à terra natal se as pedrinhas-memórias são subtraídas?

Como se reencontrar vivendo distraído e hipnotizado com tantas possibilidades externas? Como saber sobre si quan- do a preocupação é somente sobreviver?

Além disso, temos o contexto atual que reforça conti- nuamente o afastamento de si próprio: vive-se uma tempora- lidade cada vez mais efêmera que requisita de todos nós uma atenção ampla, porém rasa; uma urgência em acolher o novo e uma destreza frente à multiplicidade de tarefas simultâneas.

Todos esses fatores (internos e externos) colocam em xeque a memória, pois se pressupõe que ela precise de um am- biente onde seja possível uma atenção profunda, um estado de repouso para abstrair-se da ação presente e se aprofundar na contemplação.

Henri Bergson, filósofo e diplomata francês falecido em 1941, sustentava essa relação entre a memória e o tempo, ao afirmar que “a memória é a vida do espírito por excelência”.

Certamente, são tempos impróprios para uma mente em descanso e para um corpo quieto. As janelas da alma estão com suas redes de proteção bem instaladas, de tal forma que não há como vaga-lumes entrarem e serem pontos de luz em nosso cosmo pessoal.

Imagem de capa: Irina Kozorog/shutterstock







Psicóloga , escritora e avó apaixonada pelo seu neto e pela vida. Autora do livro "Varal de sonhos" e feliz demais com os novos horizontes literários que se abrem.