Quanto mais espaços vazios houver, mais coisas inúteis a gente vai juntar! Isso vale tanto para casas, quanto para quartos, mentes e corações.
Basta parar um instante e trazer à lembrança exemplos de casas que têm “aquele quartinho que não é de ninguém”. Espere alguns dias, e poderá observar que o lugar começará rapidamente a ganhar ares de acumulação.
Vem um e larga lá aquele casaco de neve, que ninguém vai usar tão cedo, porque aqui não neva. E, para falar a verdade, viajar para lugares nevados anda meio fora das possibilidades orçamentárias. Vem outro e deposita num cantinho, um violão ou um teclado que comprou por impulso, acreditando que arranjaria tempo para aprender a tocar um instrumento. Vem mais um outro e abandona em outro lugarzinho aquela coleção de revistas, ou figurinhas, ou canecas, ou sabe-se lá que outro tipo de cacarecos que, em algum momento da vida fazia todo sentido. Mas agora não faz mais.
Mais algumas semanas e o lugar terá se transformado num depósito de coisas aleatórias e esquecidas. Mais alguns meses e a imagem será a de um caos, digno daqueles programas de TV a cabo, que mostram o triste destino de pessoas que não conseguem se desapegar de nenhum objeto que comprou, ganhou ou adquiriu sei lá de que jeito.
Pois com a vida em si, não é nada diferente. Mentes vazias são lugares absolutamente tentadores para ideias inúteis. Elas vão chegando de mansinho, ficam ali bem quietinhas num cantinho; com o tempo, penduram uma rede nas paredes da memória e vão se acomodando.
E, de repente, aproveitando-se de nossa distração, fazem morada dentro da gente, com direito a capacho na porta e tranca pelo lado de dentro. Instalam-se.
Tomam conta. Vão ocupando nossa cabecinha oca com pensamentos paralisantes e parasitas, que se alimentam vigorosamente de nossa criatividade, perseverança, esperança e amor próprio.
E, depois dessa apropriação indébita meu amigo, haja força de vontade e coragem para mover uma eficiente e definitiva ação de despejo.
E se mentes vazias são um perigo… Corações vazios são muito mais! Corações vazios são uma espécie de Resort com sistema “all Inclusive” para sentimentos corrosivos como a mágoa, a inveja, o ciúme e a ambição sem medida. Para cada uma dessas pragas emocionais são estendidos tapetes vermelhos, oferecidos drinks exóticos de boas-vindas e preparadas camas irresistíveis onde cada uma delas deita, rola e fica.
A vida é um eterno quarto de bagunças. Sempre haverá algo que a gente guarda, quando já deveria ter jogado fora. E é por isso que, vez em quando, não custa nada fazer uma visitinha àqueles cômodos mal iluminados e sombrios. Abrir janelas e cortinas. Deixar que o cheiro de coisa guardada seja levado com o vento. E permitir que novos ares sejam bem-vindos. Porque tudo aquilo que deixarmos ficar, nos definirá diante de nós mesmos e dos outros. E uma vida pendurada de sentimentos gastos e cobertos de poeira velha é uma vida pequena demais.
Imagem de capa meramente ilustrativa: “Os delírios de consumo de Becky Bloom”
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