Este é um texto em defesa dos meninos. Um texto em busca de oferecer uma chance de transformação a todos os meninos que ainda são criados para serem machos e não homens.
É um pedido de socorro em nome desses pequenos que têm negadas suas necessidades de afeto e doçura, em nome de crenças nocivas e ultrapassadas segundo as quais “homem que é homem, não chora”; “homem que é homem, não nega fogo”; “homem que é homem, não leva desaforo para casa”; e, sobretudo “homem que é homem, gosta é de mulher”.
Ouso fazer um convite para que nos despojemos de todas as verdades cristalizadas que nos impedem de olhar para essas crianças como seres em cuja alma há, mais do que tudo, um anseio pela liberdade. Infelizmente, liberdade é uma palavra que anda meio desbotada e cujo significado mais orgânico, deixou de fazer sentido.
A liberdade é o único caminho possível para as inúmeras outras estradas dessa vida que possam nos levar a lugares que realmente valham a pena. Só é possível ser livre quando temos todas nossas dúvidas, inseguranças, anseios, talentos, naturezas e dificuldades aceitas com a mesma força amorosa; e somos capazes de oferecer todas essas coisas ao outro na mesma medida em que esperamos recebê-las.
Meninos criados para serem livres em suas múltiplas formas de se manifestar, existir, sentir, pensar, acreditar e duvidar têm a real oportunidade de se transformarem em homens íntegros. E nossos meninos, por mais incrível que pareça, ainda são privados desses direitos.
Muitos dos nossos meninos são estimulados sexualmente de maneira precoce e equivocada, para atender uma expectativa social que os induz a olharem para suas parceiras meninas como seres de outra natureza; seres que precisam de alguma forma aplacar ou satisfazer suas necessidades supostamente incontroláveis de natureza masculina.
Ainda existem famílias que consideram mais difícil e constrangedor lidar com um menino que goste de se vestir de princesa, ou que tenha atração pelas sereias e bonecas, do que lidar com filhos agressivos, que machucam os amigos pela necessidade de se impor, no fundo, no fundo, para atender uma expectativa mais ou menos explícita sobre a sua masculinidade.
E por mais que a gente acredite que os tempos mudaram, que existe muito menos preconceito hoje do que havia cinco ou dez anos atrás, o fato é que ainda educamos nossos garotos sob padrões e modelos extremamente estereotipados.
Você está criando seu filho para ser um cara decente? E… não, não existe essa história de “depende do ponto de vista” ou “afinal, o que é ser decente?”. A decência humana não tem nenhuma relação com habilidades cognitivas, aparências externas ou comportamentos politicamente corretos.
Ser decente é ter em cada fibra, do corpo e da alma, o anseio por oferecer ao mundo o que há de mais nobre dentro de nós. É agir de forma ética, principalmente quando ninguém estiver olhando ou quando o nosso comportamento não for passível de prêmio ou punição.
E, principalmente, porque o mundo parece estar virado do avesso e os valores parecem ter sido varridos para uma galáxia distante, é que temos a obrigação de oferecer para esses pequenos de nós que nasceram homens, nosso maior e mais valioso bem: exemplo moral.
Este é um texto em defesa dos meninos. Pois, sendo eu uma menina, tenho a mais absoluta certeza de que somos todos feitos da mesma constituição humana. Não há de haver nada nesse mundo que ameace nossos movimentos na busca de uma relação de equidade. E, mais ainda, sendo eu uma menina que já é mulher há muitos anos, posso afirmar que todos os homens de caráter que eu tive o privilégio de conhecer e conviver, foram educados por pessoas que se preocuparam em criar caras decentes.
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