A rádio toca a música “Try” da cantora pop americana Colbie Caillat e me faz pensar sobre o papel do esforço nos relacionamentos interpessoais (de todos os tipos). Eu, como muita gente que conheço, já me vi fazendo muito esforço para que algumas pessoas gostassem de mim. Era um comportamento tão recorrente que o revisitei algumas vezes em consultório.
Encontrei muita coisa na raiz desse meu “esforço”, algumas causas são bem pessoais, outras são mais generalizadas. Acho que o principal ponto é que é difícil lidar com a rejeição, ninguém gosta de sentir-se rejeitado. Nós, enquanto seres humanos e sociais que somos, precisamos de conexão para viver tanto quanto precisamos de ar, é puro instinto de sobrevivência. É inerente ao ser humano esse desejo de pertencimento. Nós queremos fazer parte de algo maior que nosso próprio umbigo, desejamos fazer parte de um grupo, sempre. Portanto, é de nossa natureza buscar isso em (quase) todos os encontros que a vida nos proporciona. Mas, nem sempre essa conexão acontece da maneira como desejamos e quando isso acontece nos vemos inundados de sentimentos como frustração e rejeição que são de fato extremamente desconfortáveis. Então em uma nobre tentativa de evitar esse sentimento, nos esforçamos.
Eu tenho uma personalidade expansiva e ao longo da vida consegui fazer boas conexões com os outros, me considero uma pessoa de muitos e bons amigos. Comunicativa e alegre, sempre transitei bem por entre as diversas “tribos”. Na formatura do primeiro grau subi ao palco para receber o troféu de “mais alto astral” da turma. Na formatura da faculdade subi novamente ao palco para fazer o discurso em homenagem aos colegas. Eu sempre fui boa em fazer amigos. Por isso, não me acostumei a lidar com frequência com esse sentimento de rejeição, mesmo assim ele já existiu, em diversos momentos, por motivos, que às vezes soube identificar, outras não. Se nem sempre consigo identificar o que gera tal desconexão, o que sei afirmar com certeza é que ele é muito frustrante.
Acredito que a questão do esforço seja meio confusa para nós porque somos uma sociedade que cultiva demasiadamente um sistema de meritocracia. Enquanto na própria escola, desde muito cedo, somos ensinados que se nos esforçarmos bastante conseguiremos um bom emprego e teremos muito sucesso, infelizmente (ou felizmente) nos relacionamentos não é bem assim que funciona. Não existe sistema de meritocracia para o coração ou pelo menos, não deveria existir. Repare a natureza, nada nela acontece através de esforço. É tudo muito orgânico.
A verdade é que nem sempre conseguimos explicar porque gostamos ou não de alguém. Mas, independente disso, os melhores relacionamentos são provenientes de encontros que são fluídos, acontecem sem esforço algum. Um bom relacionamento é aquele que vem de graça, sem dívidas ou fiados, onde existe um certo equilíbrio entre o dar e receber.
Com um olhar mais atento, passei a perceber um comportamento manipulador por trás dessa máscara de “muito legal”. A pessoa que está sempre querendo agradar os outros, fazendo esforço, sendo muito prestativa, boazinha ou legal é também muito manipuladora. Geralmente são pessoas inseguras que têm muito medo da rejeição. Compreensível. Mas, são manipuladoras no sentido que, de tanto esforço feito, é privado do outro o direito de simplesmente não gostar de tal pessoa ou não querer conexão com ela. E quando, mesmo com esforço, a conexão não acontece, o vilão sempre é o outro, afinal “depois de tudo que eu fiz por/para você?”. Geralmente o outro não pediu que fosse feito nada por/para ele, mas ele leva a culpa e a má fama mesmo assim.
Hoje, como conheço essa máscara consigo ficar mais atenta, quando vejo que estou me esforçando muito para que o outro me “enxergue” eu simplesmente paro tudo. É um direito do outro não querer abrir esse canal para conectar-se comigo. Independente de qual seja o motivo. E eu preciso aprender a lidar com esse sentimento de frustração da melhor maneira possível, pois é a maior prova de respeito que posso dar para o outro (e para mim): o direito que ele tem de não querer conexão comigo. Ponto final.
E quando isso acontece é importante também não levar para o lado pessoal. Para isso também preciso deixar de lado o ego e aprender a me dar menos importância. Nem tudo está relacionado à minha pessoa, nem sempre foi algo que eu fiz, nem sempre o problema sou eu, às vezes é o outro. Na verdade existem ene motivos que podem levar uma pessoa à não querer fazer tal conexão comigo. E é perda de energia preciosa e tempo viver de achismos ou deduções, mas o que posso fazer para preservar a minha alma e meu coração nesse processo tão frustrante, é saber identificar quando estou recebendo nada ou muito pouco e quando é a hora de parar de tentar. Simplesmente parar de me esforçar e deixar estar. Deixar livre, deixar ir.
You don´t have to try so hard.
Escute a música:Colbie Caillat – Try
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