Quem viveu na década de 80 em algum momento certamente passou os olhos pelo seriado “A Ilha Da Fantasia”. Resumidamente a série falava de uma ilha paradisíaca onde qualquer desejo podia ser realizado. Um sonho, não? O anfitrião dessa ilha, o senhor Roarke, (Ricardo Montalban), juntamente com seu auxiliar (Hervé Villachaize), o pequeno Tattoo, realizavam as fantasias mais delirantes de pessoas comuns que chegavam até a ilha bastante animadas.
Ao adentrarem o reduto do lugar, a bordo de um avião planador, os hóspedes tinham suas histórias de vida contadas pelo misterioso anfitrião Roarke ao pequeno Tattoo e Roarke, que estava ali como um gênio da lâmpada, tornava real o que parecia impossível.
Quando pensamos no termo “fantasia”, nossa mente nos remete aos redutos quase proibidos do desejo. No dicionário “fantasia” se define como imaginação, capricho ou vestimenta que se usa no carnaval. A própria significância da palavra nos remete a ideia de que a “fantasia” é um adereço, é algo que nos foge no cotidiano, mas que um dia alimentamos alcançar ou gozar.
A Ilha da Fantasia era isso, um paraíso no qual nada era reprimido ou repreendido, no entanto, quem pedia o que pedia, tinha que arcar com todas as conseqüências do desejo realizado. Em grande parte dos episódios as pessoas chegavam empolgadas até o local, acreditando que tendo as fantasias realizadas iriam viver de forma plena, no entanto, a maior parte delas acabava sofrendo com desconfortos e decepções no decorrer dos dias. A realização das fantasias quase sempre não trazia a tão almejada felicidade.
E eu na minha meninice, ao assistir a série na época, me perguntava como podiam os adultos desejarem aquilo que não lhes fazia bem e ficava perplexa ao ver, em todos os capítulos, pedidos se mostrarem bastante equivocados.
Com o passar do tempo e, observando com atenção o mundo que me cerca, percebi que a Ilha da Fantasia é na verdade um pequeno lote de um mundo de aspirações que quase sempre não dão em nada. De aspirações que uma vez supridas se esvaziam por não terem um real embasamento, por não expressarem o que vem do coração.
Então não é difícil encontrar por ai pessoas desejando o status das coisas, sem perceberem que existe no êxito muito esforço aplicado. Não é raro ver, no cotidiano, aptidões tecidas não pelo gostar, mas pelo montante pago por determinada área. Então existem os que querem cantar, escrever, e atuar pela fama. Os que querem exercer uma profissão pelo que podem receber. Os que querem um relacionamento para suprir necessidades e caprichos pessoais. Os que desejam mostrar ao mundo que são o que não são.
Nesse ponto tocamos no delicado ponto em que as coisas se subvertem. Então muitos comemoram exaustivamente a entrada na faculdade e não a conclusão dela. Comemoram com fogos de artifício a abertura de um negócio e não o sucesso dele na languidez dos anos. Almejam a fama, mas deixam pra lá a ideia de que existe um esforço enorme por trás do reconhecimento do mérito. Casam-se fazendo festas milionárias, mas não se dão conta de que o casamento exige cumplicidade e empenho mútuo. Muitos querem confetes e serpentinas sempre, mas carnaval mesmo acontece só uma vez ao ano.
O que Roarke fazia na ilha era conceder o desejo realizado, mas orientava sobre seus sabores e dissabores. Então os hóspedes se esbaldavam com o deleite proporcionado pela fantasia realizada, mas não demorava muito para implorarem a normalidade das coisas.
Sim, pois desejar ser Beyoncé é uma coisa, ser Beyoncé é outra. Ela certamente tem fama e dinheiro, mas não pode andar sossegada pelas ruas da cidade onde vive e esse é um aspecto que não pode ser ignorado.
Tudo tem seu preço e o que faz com que o paguemos felizes é ter nossos desejos nascidos da emoção e não da razão das coisas. Só realmente amando ser e fazer o que nos propomos, podemos vestir a felicidade e usá-la por longos dias, sem lançá-la para o alto na primeira dificuldade que nos surja. A fantasia cheia de delírios e lantejoulas, que puxamos do baú uma vez por ano, é muito bonita, mas ela não deve ser adotada como vestimenta para o dia a dia, pois machuca, entristece e incomoda, haja visto que não é tecida pelo que verdadeiramente nos traduz.
Nos deixar tocar pelas coisas simples da vida pode nos parecer usual, mas é de extremo valor. É no coração que mora a verdade de cada um e essa verdade não exige explicações. O que os outros vão pensar sobre nossas escolhas, não nos cabe. Cabe a nós saber bem o que escolher, amar ser e fazer o que nos propusemos e entender que a felicidade é tímida e quase sempre não gosta de alardes.
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